Difusão da Covid-19 em São José (SC)

24/04/2020 13:00

Santa Catarina anunciou medidas de afrouxamento no isolamento social recentemente, mesmo com números de casos confirmados e óbitos subindo cotidianamente e contrariando as recomendações da OMS, que apresenta o isolamento social como melhor medida de contenção na difusão da COVID-19.

 

Os dados apresentados dia 24 de abril pelo Governo de Santa Catarina evidencia que os quatro municípios mais populosos, segundo estimativas do IBGE em 2019, são os com maiores números de casos confirmados, são eles: Florianópolis (251 casos), Joinville (127 casos), Blumenau (90 casos) e São José (49 casos). Os três primeiros municípios se destacam por serem polos regionais, gerando fluxos por conta das interações espaciais, principalmente regionais, enquanto São José faz parte da Região Metropolitana de Florianópolis, na qual sofreu forte expansão nas últimas décadas por conta da pressão imobiliária, tendo um aumento expressivo no adensamento populacional.

 

A RMF (Região Metropolitana de Florianópolis) tem Florianópolis como principal polo de confirmados por COVID-19, sendo que Capital é responsável por grande parte dos movimentos pendulares dessa região. Com as medidas de afrouxamento, liberando diversos setores da economia, os deslocamentos dentro da RMF podem provocar o aumento na disseminação do vírus em municípios que atualmente tem baixos índices de casos confirmados e óbitos.

 

Casos Confirmados e de Óbitos por COVID-19 nos municípios da RMF

Fonte: Governo do Estado de Santa Catarina (24/04/2020)

O município de São José ainda não conta com a confirmação de casos da COVID-19 em todo seu território, sendo possível o controle maior da disseminação do vírus caso o Estado siga as orientações da OMS, abaixo será possível verificar o número de casos confirmados por bairro no município.

Casos de COVID-19 por bairros em São José/SC

São José tem casos tantos nos bairros mais populosos como Serraria e Barreiros, como em bairros menos populosos, caso da Ponta de Baixo, Picadas do Sul e outros, porém ainda há bairros no qual não há casos confirmados, como Roçado, Sertão do Maruim, Forquilinhas e outros. Não ter casos confirmados não significa não haver pessoas nesses bairros com COVID-19, pois não há em São José testagem em massa, ou seja, a população josefense não está sendo testada, apenas alguns casos suspeitos estão sendo submetidos a testes.

 

Os casos suspeitos são pacientes que se deslocam ao centro de triagem no município com sintomas ou pessoas que passam pelas “blitz da saúde” realizada em alguns bairros onde é aferido a temperatura, sendo as pessoas com febre encaminhadas a triagem, logo, o número de amostragem para pessoas com COVID-19 é subestimado, pois segundo o Ministério da Saúde[1] 80% das pessoas que tem a COVID-19 podem ser assintomáticos, ou seja, a amostragem por testagem é extremamente baixo e ainda pode haver uma parcela significativa da população circulando, principalmente com as medidas de afrouxamento, transmitindo o vírus de forma assintomática.

 

Há estudos no Brasil que apresentam um número de contaminados de 12 a 15 vezes[2] maior do que os números oficiais do país, principalmente por ser realizado poucos testes, esse fato se reflete nos números apresentados, segundo médico Julival Ribeiro, porta-voz da Sociedade Brasileira de Infectologia, o número é baixo para comparativos com outros países, até o dia 22 de abril o Governo Federal entregou apenas 2,5 milhões de testes[3] aos estados, que possibilita o teste em apenas 1,19% da população do país, o que torna os dados oficiais dos Governo Federal, Estaduais e Municipais, insuficientes para compreensão da realidade dos casos no território.

 

Para haver maior controle é necessário planejamento e para isso o Estado deve realizar testagem em massa, como outros países realizaram, pois atualmente no Brasil há uma subnotificação de casos por conta da falta de testes, o que impossibilita, inclusive, o Estado ter poder na tomada de decisão.

 

Atualmente o Governo Federal vem negligenciando medidas que já deveriam ter sido tomadas, como manutenção do isolamento social, pagamento de auxílio a população, testagem em massa, construção de hospitais, chamamento público de profissionais de saúde e demandar a indústria nacional para produção de insumos necessários ao combate da COVID-19. Na contramão dos esforços internacionais de combate a Pandemia, o Presidente Jair Bolsonaro ataca Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da OMS[4], isolando o Brasil internacionalmente e criando crises internas com Governadores e seus próprios ministros, com a retirada do ex-Ministro Saúde Mandetta e ex-Ministro Moro.

 

Nesse momento de Pandemia o Estado brasileiro deveria concentrar os esforços em garantir a população segurança para o isolamento social, como outros Estados Nacionais o fizeram e estão fazendo e não gerando insegurança com falas anticientíficas ou até mesmo fictícias.

[1] https://coronavirus.saude.gov.br/sobre-a-doenca

[2] https://noticias.uol.com.br/saude/ultimas-noticias/redacao/2020/04/14/pesquisas-subnotificacao-c%20asos-confirmados-brasil.htm

[3] https://www.terra.com.br/vida-e-estilo/saude/teich-ignora-subnotificacao-ao-dizer-que-brasil-tem-melhor-desempenho-contra-o-coronavirus,22e17014c4427dcaa03aa7c1ebc16e9evt9uc19k.html

[4] Brasil é deixado de fora de aliança sobre acesso a tratamentos na OMS (UOL) https://noticias.uol.com.br/colunas/jamil-chade/2020/04/24/sem-brasil-oms-faz-mega-evento-com-lideres-mundiais-e-rebate-bolsonaro.htm

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COVID-19 e Circulação: transporte aéreo de passageiros e a rede urbana de São Paulo

11/04/2020 13:00

Recentemente fizemos uma reflexão sobre os possíveis desdobramentos após a redução dos voos de passageiros para a “malha essencial”[1].Fica cada vez mais evidente que em locais onde limitou-se a circulação, foram exatamente onde houveram menos casos de COVID-19, haja vista que as recomendações da Organização Mundial da Saúde seja exatamente o isolamento social.

 

O gráfico de casos da pandemia pelo país ruma ao seu ápice. Provavelmente daqui a duas semanas teremos noção da devastação que esse vírus deixará no país. Se em países onde restringiram-se severamente a circulação, mostram altos índices de casos, no Brasil, onde pouquíssimas localidades tentam fazer por “contra própria” o isolamento, teremos números alarmantes. Até porque, na contramão de TODOS os países que enfrentam o vírus, o “presidente” do Brasil é único que incentiva a população a ir para as ruas (contrariando a própria OMS).

 

A população de modo geral precisa se conscientizar do isolamento social. Quanto antes nos precavermos, mais cedo tudo passará, e aos poucos a quarentena vai sendo reduzida. Embora hajam setores que sejam impossíveis de parar, aqueles que podem exercer suas funções “de casa”, são os que mais devem “dar exemplo”. A realidade de vários municípios (inclusive de onde escrevo esse texto, Guapimirim, na Região Metropolitana do Rio de Janeiro) é total o descaso da população. Agem como se nada estivesse causando várias mortes pelo mundo, que jamais serão contagiados, que não são grupo de risco, ou pior, “é apenas uma gripezinha”. O COVID-19 já provou que é muito mais agressivo que a H1N1[2], contrariando as fake news disparadas na rede.

 

Entendemos que a economia precisa funcionar, e é para isso que o Estado existe. Ele é fundamental para que, mesmo nesse período de crise, aja de forma consciente, principalmente em prol daqueles mais necessitados. Países como E.U.A. e Argentina, buscam de alguma maneira, manter a economia funcionando pagando o salário para as pessoas ficarem em casa e evitar aglomerações. Na contramão, o Brasil financia os Bancos privados, e vê o auxílio de R$600 como um “esforço” , o que é obrigação e dever do Governo. Entretanto, já era de se esperar que o Governo Bolsonaro iria agir dessa forma durante seus possíveis anos de mandato....

 

Mesmo assim, os Governadores estaduais buscam se unir em blocos “vizinhos” para combater o vírus, buscando medidas para limitar ao máximo a circulação de pessoas nas ruas (exemplo do bloco sudeste e nordeste). Embora tenham tentado limitar (em alguns casos de até suspender) as operações aéreas regulares de passageiros, quem tem o “poder” é a ANAC e a presidência da república.

 

Elencamos anteriormente que, se de fato a política de centralização de voos se mantivesse, as companhias se concentrariam no estado paulista, sobretudo em Guarulhos e Campinas [3], nada menos do que no epicentro da pandemia no país. Além do hub aeroportuário, vale lembrar que a rede urbana dessas cidades extrapola inclusive os limites estaduais, o que nos leva a refletir que, a zona de influência desses municípios abrange um alto contingente populacional. Podemos observar no mapa abaixo essa questão.

 
 

O setor aéreo é fundamental para o funcionamento de um país de larga escala territorial como Brasil. Atualmente desempenha o transporte de suprimentos entre as diferentes unidades da federação e cargas urgentes, além do transporte de passageiros.

 

No momento em que se concentram todos os voos nos aeroportos, exige-se que tenham mais fluidez para a atender a demanda, e com isso, a necessidade de mais pessoas interagindo no mesmo espaço.

 

Se numa pandemia em que a principal forma de evitar o contágio, é evitando o contato entre as pessoas, concentrar voos em um aeroporto (que já está numa área de risco) é uma ação correta?

 

Compreende-se que os voos mantidos são fundamentais para atender a demanda, mesmo que com números reduzidos. No entanto, essa política de concentração de voos não deveria ser aplicada no estado de São Paulo, mas sim numa localidade em que seja mais viável de manter o isolamento.

 

Será que, em algum momento se pensou no trabalhador aeroportuário? Nas pessoas que estão atuando no check-in, na segurança, nas esteiras, nas tripulações e em outros serviços necessários para a realização dos voos? Observe que, se essas pessoas têm contato com o vírus, quando seguem para casa, ao pegarem o transporte coletivo, aumentam ainda mais sua exposição. Ao chegarem em casa, têm contato com a família, e possivelmente a transmissão do vírus.

 

Exigir da logística de Estado (em pontos normativos) e da logística corporativa (estratégias competitivas) uma revisão do modelo que foi implementado é algo primordial. A ANAC pode transferir essas operações para um aeroporto numa localidade mais isolada e reduzir ao máximo os voos em zonas com alto índice de transmissão de COVID-19. Já as companhias, podem deixar de quarentena (em hotéis) aqueles trabalhadores que estão em contato direto com o público, limitando o contato com outras pessoas externas ao setor aéreo. Claro, que tudo isso atrelado aos controles sanitaristas.

 

Podemos usar a matemática simples de 1 funcionário que trabalhe no embarque de passageiros: supondo que ele faça o despacho de em média 4 voos por dia, este entra em contato com pelo menos 500 pessoas. Além disso, ele interage com outros setores do aeroporto e, após o serviço, segue para sua casa pelo transporte coletivo. Podemos considerar uma lotação média de 30 passageiros (seja no metrô ou ônibus, embora a realidade seja bem superior a isso), dessas 30 pessoas, contando que a família de cada um tenha 3 pessoas, serão mais 90 pessoas que estariam expostas. E por aí vai a conta... Se ficasse isolado, evitaria muitos riscos de contágio. Se observamos os casos de COVID-19 no Brasil, a maioria dos casos estão nas localidades em espaços de fluidez territorial, seja pelo transporte aéreo ou rodoviário (mapa abaixo).

 

Entretanto, a centralidade de capital emerge como um ponto fundamental para a tomada de decisão nesses casos. O isolamento dos funcionários aeroportuários exigiria um gasto maior do que o previsto, embora não seja algo exagerado para companhias. Porém, a busca incessante pelo lucro, faz com que o capital esteja acima de tudo e não o bem-estar social e do próprio funcionário.

 

É possível fazer isso e reduzir o contato? Sim! Cabe ao Estado firmar pactos normativos em prol disso. Mas se depender do Governo Federal Brasileiro, tratando o COVID-19 como uma “gripezinha” na figura do “presidente”, os resultados alarmantes farão parte de uma história em que a ciência foi substituída pelo achismo. E que o afrouxamento das regras de isolamento foi determinante para o ápice do gráfico de casos, e consecutivamente o colapso do sistema de saúde. Quando tudo isso acabar, o mundo não será o mesmo, disso não tenhamos dúvidas. O distanciamento social, o home office, precarização de outros serviços, aumento da informalidade, redução da circulação, dentre outros elementos farão parte do novo cotidiano que nos espera num futuro próximo. No entanto, a população precisa estar ciente de que temos outros “vilões” além do próprio vírus...

 

Para os otimistas, o setor irá se recuperar rápido, para outros, será lenta e gradual. O que podemos afirmar é que a retomada de crescimento do setor aéreo vai exigir reinvenções, novas estratégias logísticas e resgate fundamental da aviação regional.

 

Notas

 

[1][3] Transporte aéreo no brasil em tempos de covid-19: possibilidade de um novo mercado?. Disponível em: https://marciogedri.wixsite.com/geoeconomica/single-post/2020/03/28/TRANSPORTE-A%C3%89REO-NO-BRASIL-EM-TEMPOS-DE-COVID-19-POSSIBILIDADE-DE-UM-NOVO-MERCADO

 

[2] Mortality from pandemic A/H1N1 2009 influenza in England: public health surveillance study Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2791802/?fbclid=IwAR3lRuA50ZVPQzkSgDHA1PMHBgQzXaYH-Ke0nOIeCPULeLJGrAEl-3UXCnw Acesso em: 11/04/2020

Tags: Aviação comercialCoronavírusCOVID-19LogísticaPandemiaSaúde públicaTransporte aéreoTransportes