Especial governo Lula da Silva: o PAC – saneamento básico e sua contribuição para o desenvolvimento
O saneamento deve possuir destaque nas políticas e programas governamentais, visto que é basilar para a saúde pública e para o desenvolvimento social. Está relacionado ao abastecimento de água potável, ao manejo da água pluvial, à coleta e tratamento de esgoto, à limpeza urbana e ao manejo de resíduos sólidos.
Segundo dados da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), para cada quatro dólares investidos em saneamento básico são economizados dez dólares em saúde pública. No Brasil, houve um avanço no setor na década de 1970 e início dos anos de 1980, com o Plano Nacional de Saneamento (Planasa), visando arrefecer um histórico no país. Mota (2016) revela que saúde, educação e saneamento devem ser temas centrais nas políticas públicas, sendo este último uma forma de medicina preventiva. Em outras palavras, a “vacina” para as doenças transmitidas pela água é o saneamento básico.
O Brasil – considerando suas desigualdades e regiões com falta de equipamentos e serviços de utilidade pública – apresenta reflexos da escassez de investimentos em saneamento ao longo do tempo, caso das elevadas taxas de mortalidade infantil e reduzida expectativa de vida, principalmente em municípios do sertão nordestino e do interior da Amazônia.
As expansões desordenadas e sem planejamento das regiões metropolitanas brasileiras, a falta de investimentos, sobretudo, em áreas periféricas e o rápido crescimento demográfico entre as décadas de 1930 e 1980 agravaram o problema da carência de saneamento básico no país, afetando principalmente as periferias sociais (desestruturadas) e as regiões Norte e Nordeste.
A política neoliberal dos anos de 1990 restringiu significativamente as inversões em saneamento básico no Brasil, sob o argumento do controle fiscal e da redução dos gastos/investimentos públicos. Isso agravou o problema no país e impediu um avanço maior nas ações/medidas sanitárias em bairros e regiões periféricas. Ademais, o atual governo de Michel Temer está retomando fortemente a política liberal no país, com cortes significativos, por exemplo, no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), Programa Minha Casa, Minha Vida, Luz para Todos, Água para Todos e outros.
A retomada dos investimentos em saneamento no Brasil ocorreu nos governos de Lula e Dilma Rousseff, após vinte anos de reduzidas inversões estatais. Segundo dados do Ministério do Planejamento e do Ministério das Cidades, houve a conclusão de 1.058 obras ligadas à água e esgoto entre 2007 e 2015 (total de 104,2 bilhões de reais), beneficiando cinquenta milhões de pessoas.
O PAC – saneamento básico atendeu quase a “população da Inglaterra” em oito anos (2007-2015). Tal fato elucida o compromisso assumido pelo governo federal no sentido de tentar mitigar esse gargalo histórico do Brasil. Nesse período, foram financiadas 2.914 obras pela União ou instituições estatais, com destaque à Caixa Econômica Federal (CEF) e ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), em parceria com estados e municípios. No entanto, 52% das construções do PAC – saneamento básico apresentavam problemas em 2016, como paralisações, erros de projeto/ execução ou ainda não iniciadas, prejudicando, assim, o andamento das obras (MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO, 2017).
Segundo o Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNI), o abastecimento de água tratada no Brasil atingia 82,5% da população em 2014, mas apenas 48,6% tinham acesso à coleta de esgoto. Os governos de Lula e Dilma Rousseff intensificaram os investimentos comparando-se com os anos de 1990, principalmente com o período de Fernando Henrique Cardoso (tabela 1). Além disso, em 2013, foi criado o Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab), estabelecendo diretrizes, metas e ações de saneamento básico para o Brasil entre 2014 e 2033.
De acordo com o Ministério das Cidades, entre 2003 e 2006, a média de inversões federais em saneamento foi de 1,5 bilhão de reais por ano. Todavia, esse montante aumentou para uma média anual de 7,1 bilhões de reais entre 2007 e 2015, compreendendo o período do PAC 1 e 2. No ano de 2014, somente a União aplicou 11,4 bilhões de reais em obras de saneamento básico no país, além dos financiamentos da CEF e BNDES. Em 2015, mesmo com o severo ajuste fiscal, foram investidos 5,8 bilhões de reais no setor (tabela 1).
O saneamento básico não contribui apenas com a saúde pública e com o desenvolvimento social, mas também pode fomentar o efeito multiplicador interno e o desenvolvimento regional/nacional. Investimentos estatais, participação de empresas públicas de saneamento e adequadas parcerias público-privadas (PPPs) são importantes para expandir as obras ligadas à água e esgoto no Brasil. Ademais, destaca-se a necessidade de avançar no planejamento participativo no país, visando melhor compreender as demandas sociais existentes e qualificar as políticas públicas, especialmente na oferta de saneamento à população.
Concessões adequadas e parcerias com empresas brasileiras podem criar demanda efetiva na economia e movimentar vários setores, como as indústrias de base, cimento e bens de capital, construção civil pesada etc., gerando resultados econômicos e sociais positivos, sobretudo no que tange à criação de empregos e renda.
Ignácio Rangel (1987) destaca que o Estado deve ser, ao mesmo tempo, o poder concedente e o credor hipotecário, isto é, realiza a concessão do serviço ao capital privado e coloca os bens do concessionário em hipoteca, para que, em caso de não cumprimento das metas e das obrigações estabelecidas em contrato, o Estado possa tomá-los como garantia (para evitar prejuízos) e transferir a concessão para outra pessoa jurídica.
Assim, permite-se criar demanda efetiva na economia, estimular a distribuição de renda e valorizar a saúde coletiva, especialmente das pessoas que vivem em bairros e áreas periféricas, com escassez de equipamentos e serviços públicos. A atuação do Estado deve seguir duas estratégias principais, quais sejam: a) realizar inversões em setores antiociosos (saneamento básico, por exemplo); b) estimular os investimentos privados em áreas que demandam maiores recursos (concessões adequadas para obras de água e esgoto).
Por fim, destaca-se que o severo ajuste fiscal, a aprovação da PEC dos gastos e as paralisações de muitas obras decorrentes da Operação Lava Jato estão prejudicando a construção de infraestruturas no país e, em especial, de saneamento básico. No Brasil – diferentemente de outros países como Estados Unidos, Coreia do Sul, Japão e Alemanha – as ações judiciais de combate à corrupção nas grandes empresas (caso das construtoras nacionais) “paralisam as obras”, fato que acaba punindo o trabalhador e as pessoas que necessitam gozar de melhores condições sanitárias e ambientais. Diante disso, é necessário lembrar um princípio básico do Direito: “deve-se punir o réu e não a vítima!”.