A modernização do transporte ferroviário de Cuba

31/12/2021 13:00

Por: Profº Dr. Nelson Fernandes Felipe Jr (UNILA)

 

Em 1837, Cuba foi o sétimo país do mundo e o primeiro da América Latina e Caribe a possuir o transporte ferroviário. Todavia, nos últimos trinta anos, houve uma precarização do serviço, principalmente porque desde a década de 1970 Cuba não recebia mais trens e locomotivas para operarem no sistema. A União Soviética enviou, nos anos de 1960 e 1970, algumas composições novas e, sobretudo, trens usados para serem utilizados no país caribenho. As ferrovias cubanas, desde os anos de 1990, são prejudicadas pela falta de manutenção e escassez de equipamentos modernos, como resultado da dissolução da União Soviética, da dificuldade de estabelecimento de novas parcerias tecnológicas e do embargo econômico/comercial dos Estados Unidos (SPUTNIK; vermelho, 2019).

Para mudar esse cenário, o governo cubano criou o Programa de Recuperação e Desenvolvimento do Meio de Transporte Ferroviário, que se estenderá até 2028. Como consequência desse projeto, a Russian Railways – empresa que controla as estradas de ferro na Rússia – firmou um contrato de US$ 1,98 bilhão com a União de Ferrovias de Cuba. A estatal russa será responsável por promover a ampliação e modernização da infraestrutura ferroviária no território cubano, com o objetivo de incrementar a circulação de passageiros e produtos e fomentar o desenvolvimento econômico. O projeto e o contrato firmado entre os países estabelecem que pouco mais de mil quilômetros de ferrovias serão modernizadas, além da criação de um centro de controle para gerenciar o tráfego ferroviário (SPUTNIK; vermelho, 2019).

Essas melhorias permitirão aumentar a segurança no transporte, elevar a velocidade, ampliar a abrangência espacial da rede ferroviária e otimizar o funcionamento do sistema (fluxos, horários, identificação e redução de erros de operação etc.). Outrossim, em 2019 e 2020, Cuba recebeu 160 novos vagões fabricados na China que estão em circulação para atender a demanda por transporte no país, especialmente na capital Havana, e essa frota será ampliada nos próximos anos (ALEKSÁNDROVA, 2019, 2020).

A aquisição dos novos vagões e locomotivas foi/é resultado de uma parceria com a China, assim, esse acordo prevê que o país asiático deverá produzi-los e também fornecer empréstimos para Cuba poder compra-los. A modernização e a operação das novas composições ferroviárias permitem aumentar a velocidade e diminuir o tempo das viagens. Cada trem possui capacidade para transportar 766 passageiros e existem diversas linhas que interligam cidades importantes, como Havana, Matanzas, Santiago de Cuba, Holguín e outras (SPUTNIK; vermelho, 2019).

Em 2018, o sistema ferroviário de Cuba transportou 6,1 milhões de passageiros e, a partir desse projeto, das parcerias com a Rússia e a China e os investimentos que serão realizados nos próximos anos, o governo cubano prevê que todas as obras estejam finalizadas até 2030. Além disso, há possibilidade de construção de uma linha ferroviária para circulação de trens de alta velocidade, conectando Havana ao balneário de Varadero (ALEKSÁNDROVA, 2019).

Os países da América Latina e Caribe apresentam pontos de estrangulamento nas infraestruturas e precisam avançar no processo de integração territorial, diante disso, é importante fomentar especialmente o modal ferroviário e a multimodalidade/intermodalidade. Em relação aos grandes projetos de infraestruturas na atualidade, destaca-se a Iniciativa Cinturão e Rota (também denominada de Nova Rota da Seda), em que o governo da China pretende investir mais de US$ 1 trilhão em infraestruturas na Ásia, Europa, Oriente Médio e África. O plano chinês iniciou-se em 2013 visando criar novas oportunidades de investimentos, impulsionar o comércio e o crescimento econômico, aumentar a fluidez e as redes intermodais, entre outros.

A China se destaca na expansão dos fixos no seu território e também em outros países. O desenvolvimento econômico chinês é resultado de vários fatores, como o planejamento estatal, os vultosos investimentos em infraestruturas econômicas e sociais (grandes projetos e obras, notadamente a expansão/modernização dos equipamentos e serviços de utilidade pública), o fomento da indústria, a agregação de valor e tecnologia na produção, a valorização da C&T, as empresas estatais estratégicas, os financiamentos e subsídios, entre outros.

A intensificação da inserção chinesa no comércio, nas parcerias e nos investimentos internacionais, bem como as mudanças na lógica produtiva e exportadora, são relevantes para compreender o dinamismo do país asiático. Ademais, a China vem ampliando as inversões e os acordos comerciais com os países periféricos, principalmente com nações da África e da América Latina e Caribe (caso da modernização do sistema ferroviário de Cuba). Assim, a China assegura o acesso às matérias-primas (importantes para a produção industrial), aumenta as possibilidades de investimentos das empresas estatais e privadas chinesas (energia, construção civil pesada, indústrias de média e alta tecnologia, mercado de ações etc.) e garante mercados consumidores para suas mercadorias, sobretudo manufaturas, têxteis, eletroeletrônicos, informática e bens de capital (JABBOUR, 2010).

Considerando o ambiente internacional de exacerbada competição, cujos efeitos se desdobram rapidamente na América Latina e Caribe, é necessário os países avançarem na integração territorial e nas parcerias estratégicas, valorizando a expansão das infraestruturas, a cooperação política, econômica, financeira e tecnológica, o incremento do comércio, a defesa dos interesses comuns das nações, entre outros. Entretanto, isso somente é possível com a existência de condições políticas favoráveis (o que não existe no Brasil desde 2016) e com o estabelecimento de uma política macroeconômica desenvolvimentista, com destaque à expansão/modernização dos equipamentos e serviços de utilidade pública (transportes, energia, telecomunicações, saúde, educação, saneamento básico, internet etc.). Exemplos nesse sentido são verificados atualmente na África (Etiópia), na América Latina e Caribe (Cuba) e na Ásia (Vietnã, China, Coreia do Sul, Cingapura etc.). Ao mesmo tempo que alguns países estabelecem projetos e programas de desenvolvimento, o Brasil afunda na crise política, econômica e social. Esperamos um futuro melhor!

Referências

ALEKSÁNDROVA, M. Cuba receberá US$ 2 bilhões da Rússia para suas redes ferroviárias. 2019. Disponível em: https://br.rbth.com/economia/82937-russia-dara-2-bilhoes-ferrovias-cuba. Acesso em: 17/08/2021.

JABBOUR, E. Projeto nacional, desenvolvimento e socialismo de mercado na China de hoje. Tese de Doutorado em Geografia. Universidade de São Paulo (USP). São Paulo, 2010.

SPUTNIK. Cuba inaugura novo sistema ferroviário em parceria com Rússia e China. 2019. Disponível em: https://operamundi.uol.com.br/sociedade/59478/cuba-inaugura-novo-sistema-ferroviario-em-parceria-com-russia-e-china. Acesso em: 16/08/2021.

VERMELHO. Com a ajuda de China e Rússia, Cuba inaugura sistema ferroviário. 2019. Disponível em: https://vermelho.org.br/2019/07/14/com-a-ajuda-de-china-e-russia-cuba-inaugura-sistema-ferroviario/. Acesso em: 18/08/2021.

Autor

Prof. Dr. Nelson Fernandes Felipe Junior

Docente do curso de Geografia

UNILA/PPGICAL

Tags: CubaDesenvolvimento econômicoInfraestruturasTransporte ferroviário

Notas sobre a China e os investimentos externos no Brasil

28/11/2019 13:00

Com o avanço das políticas públicas de redução da participação do Estado na década de 1990, o Brasil passou por uma série de leilões de privatização e/ou concessões, nestes leilões, setores como bancários, energético e transporte encontravam-se como os mais expressivos.

 

Considerando uma década de abertura econômica e inserção do capital externo na economia brasileira, o Brasil passa a receber um aumento substancial de IED por via de fusões e aquisições. Chegada a década de 2000, com a entrada do governo de Luiz Inácio Lula da Silva em 2003, a economia brasileira começa a passar por uma série de transformações no âmbito social e econômico, não somente interno como também externo, colaborando para o aumento do IED no país dada a segurança política e o crescimento econômico nacional.

 

Neste cenário de crescimento econômico positivo, a China torna-se um dos principais parceiros comerciais do Brasil, importando elevada quantidade de commodities e aumentando por sua vez seu fluxo de investimentos no país.

 

Setores como energético e metais no ano de 2005 encontram-se como os mais expressivos deste tipo de investimento, somando juntos um total de 670 milhões de dólares. Em 2009 o setor de metais, muito pela compra de parte da Vale pela CIC e investimento da WISCO em greenfield, somam juntas um total de 900 milhões de dólares em investimento chinês.

 

Durante o governo Lula o setor energético e metal foram os mais expressivos, no que diz respeito ao fluxo de capital externo chinês no Brasil, somando um total de 17 bilhões de dólares em investimentos incluindo setores como transporte, financeiro e imobiliário.

 

Passado o governo Lula e a entrada da presidenta Dilma Rousseff, temos o aparecimento de novos setores na pauto de investimentos chineses no país, como: químico, logística e tecnológico, os quais passam a também fazer parte deste leque de frentes de investimentos no Brasil pela China com um total aglomerado entre os anos 2011-2016 (ano do golpe sofrido pela presidenta) um total de 36 bilhões de dólares elevado principalmente pelo setor energético com um acumulado de 26 bilhões de dólares entre os mesmos anos.

 

Passado o ano do golpe (2016) os investimentos chineses se concentram em três principais frentes: energia, agricultura e transporte somando um total de 10 bilhões de dólares, destaque para o setor energético com um total acumulado entre os anos de 2017 -2018 de 6 bilhões de dólares.

 

No ano de 2019, que ainda não se encerrou, temos um total de 1,6 bilhões de dólares destaque para o setor de transportes com 680 milhões acumulados 100 milhões a menos que o setor energético 780 milhões investidos pela China General Nuclear na geração e compra das Usinas eólica e solar na região Nordeste do país. Cabe também ressaltar que os investimentos chineses no setor energético brasileiro principalmente no segundo mandato do governo Dilma, foi barrado pela presidenta na busca de manter o setor em sua maioria nacionalizado.

 

Em âmbito geral entre os anos de 2005-2019 temos um total de 65 bilhões de dólares investidos pela China no Brasil, o setor energético é de longe o que possui o maior acumulo de investimentos, seguido por metais e transportes como apresenta o gráfico a seguir:

 

Gráfico 1 – Investimento estrangeiro chinês por setor no Brasil (2005 – 2019)

Fonte: AEI, 2019. Org: HAMADA, G.K.F. 2019

Os setores no Brasil com maior montante de investimento estrangeiro chinês são: energético, metais e transporte entre os anos de 2004 – 2019; O primeiro (energético) acumula um total de 47, 3 bilhões de dólares; Metais 4,8 US$ bilhões; Transporte 4 US$ bilhões; também o setor da agricultura com 3,2 US$ bilhões.

 

Cabe ressaltar, que a retomada da proximidade política com os Estados Unidos pelo atual presidente Jair Messias Bolsonaro, assim como a instabilidade política e econômica interna, pode influenciar diretamente nos fluxos não somente de IED em greenfields ou fusões e aquisições, como também nas exportações e importações em alguns setores da economia brasileira dada a prioridade (submissão) do Brasil no atual momento político do país com os EUA.

Tags: ChinaComércio ExteriorGlobalizaçãoIEDInvestimento Externo DiretoReestruturação econômicaRelações internacionais

O desenvolvimento econômico de Cingapura e a relevância do setor portuário

23/08/2016 11:42

O Sudeste Asiático apresentou, sobretudo nas três últimas décadas, um intenso desenvolvimento econômico, com fortalecimento do mercado formal de trabalho, da indústria, da infraestrutura e agregação de valor e tecnologia à produção. Nesse contexto, destaca-se Cingapura, sendo um grande centro financeiro, comercial e de serviços avançados na região.

 

A pequena ilha tem menos da metade da área do município de São Paulo e possui uma população de 5,4 milhões de habitantes. Diante do seu reduzido mercado interno, a estratégia de desenvolvimento de Cingapura voltou-se ao fortalecimento do comércio exterior, com destaque às atividades marítimas – o país tem um dos principais portos do mundo, em que 20% dos contêineres movimentados no comércio internacional passam por esse complexo anualmente.

 

A economia de Cingapura está relacionada, principalmente, à produção e montagem de artigos eletrônicos, à indústria farmacêutica e aos serviços modernos (incluindo os transportes e o setor financeiro), sendo que este último representa 70% do produto interno bruto (PIB) do país asiático. Ademais, o turismo é uma atividade econômica que está em crescimento no país, atraindo pessoas especialmente da Ásia (chineses, indianos, japoneses, coreanos, indonésios etc.) (BANCO MUNDIAL, 2016).

 

Nos anos de 1960, o governo de Cingapura estimulou a política de substituição de importações no país, visando fomentar a atividade industrial. A restrição às importações foi pautada na proteção alfandegária que garantia uma reserva de mercado ao capital endógeno. A participação estatal e o planejamento macroeconômico se fortaleceram nas décadas de 1960 e 1970, não apenas no setor industrial, mas também na habitação, educação e serviços públicos.

 

Considerando seu reduzido mercado doméstico, a estratégia da industrialização cingapuriana orientou-se para as exportações, com importante agregação de valor e tecnologia. A expansão da infraestrutura permitiu aumentar a circulação e a fluidez no território, bem como expandir suas conexões com a Ásia e outros continentes através dos transportes marítimo e aéreo (SERRA, 1996).

 

O desenvolvimento econômico de Cingapura baseou-se nos investimentos públicos e privados, com ênfase à atração de inversões estrangeiras e, em especial, do grande capital de países centrais. Dessa maneira, aumentou a produção de artigos têxteis, eletrônicos, refino de petróleo, construção naval e outros. Nas décadas de 1960 e 1970, com o objetivo de alavancar a industrialização nacional, o governo estabeleceu a política de desvalorização cambial, com resultados expressivos no setor secundário, consequentemente, o crescimento médio do PIB de Cingapura entre 1965 e 1975 foi de 10% ao ano (SERRA, 1996).

 

A partir dos anos de 1980 houve uma reestruturação da economia de Cingapura, pautada na modernização, nos investimentos estatais e estrangeiros, bem como na expansão dos serviços financeiros e de alta tecnologia. Assim como os demais Tigres Asiáticos, os principais produtos voltados à exportação de Cingapura possuem elevada tecnologia (caso, por exemplo, dos artigos eletrônicos), com maior impulso nas duas últimas décadas.

 

Devido à pequena extensão territorial, o país possui poucos recursos minerais e uma reduzida área disponível para a agropecuária, sendo necessário, portanto, importações de matérias-primas, alimentos e energia. Não obstante, o país transformou-se em uma plataforma de exportação, com destaque às movimentações portuárias de carga geral conteinerizada. A expansão do comércio exterior do país é resultado de políticas de desenvolvimento conduzidas pelo Estado, juntamente com a atração de investimentos externos diretos na economia de Cingapura, com ênfase às atividades industriais, transportes, serviços avançados e setor financeiro.

 

Os principais produtos exportados por Cingapura são os aparelhos eletrônicos, máquinas, equipamentos, remédios e combustíveis, já nas importações destacam-se as máquinas, equipamentos, produtos químicos, bens de consumo e alimentos. No que tange aos maiores parceiros comerciais do país, têm-se: Hong Kong, Malásia, Indonésia, China, Japão e Estados Unidos (tabela 1).

 

Houve expansão da atividade econômica e do comércio de Cingapura entre 2008 e 2015, com incremento das exportações e importações do país (tabela 1). O planejamento e os investimentos públicos e privados buscam modernizar a economia e os serviços públicos, com interesse especial às grandes obras de infraestruturas, como portos, rodovias, ferrovias e aeroportos. Cingapura é um hub da aviação no Sudeste Asiático, com muitas conexões e escalas de voos que articulam, sobretudo, os Estados Unidos e a Europa à Ásia.

 
 

Aproveitando as condições do meio abiótico, em Cingapura há importantes atividades ligadas à pesca e aquicultura, reduzindo relativamente a necessidade de importar alguns alimentos, como mariscos, peixes, frutos do mar e outros. O país apresenta um Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) alto, possuindo especialmente uma elevada escolarização da população.

 

Há uma marcante presença do capital externo em Cingapura, assim como de uma força de trabalho oriunda de diversos países, principalmente do Sudeste Asiático, do Oriente Médio e da África. Muitos trabalhadores da construção civil e de atividades de menor tecnologia são estrangeiros, sendo relevantes para a produção nacional. Cingapura compõe o Bloco Ásia-Pacífico (Asia-Pacific Economic Cooperation – APEC), sendo o Porto de Cingapura um dos principais pontos nodais dos fluxos marítimos internacionais.

 

A estratégia de desenvolvimento e modernização da economia de Cingapura teve/tem como um dos seus pilares a atividade portuária, principalmente a movimentação de carga geral conteinerizada, destacando-se pela eficiência e grande fluxo de bens industriais e navios. A política econômica de agregação de valor à produção e às exportações somou-se à expansão e qualificação das infraestruturas, sobretudo portuárias, com articulação entre o setor público e a iniciativa privada. Todavia, o país destaca-se não apenas na atividade portuária e marítima, mas também na construção naval, caso, por exemplo, das empresas Keppel Corporation e Jurong Shipyard.

 

O Porto de Cingapura (tabela 2) possui a característica de ser “alimentador” (distribuidor) de cargas, ou seja, atende, sobretudo, necessidades de importação e exportação de outros países, sendo estratégico para o comércio internacional, principalmente na Ásia. Possui grandes instalações e terminais, equipamentos de alta tecnologia e expressiva movimentação de bens acondicionados e navios porta-contêineres. Esse complexo portuário caracteriza-se pelo carregamento e descarregamento de grandes embarcações, atendendo demandas, especialmente, dos maiores mercados consumidores do Sudeste Asiático e da Oceania (é um “nó” importante dos fluxos marítimos entre o Oriente e o Ocidente).

 

O Porto de Cingapura é o segundo que mais movimenta contêineres no mundo, fato que elucida sua modernização e capacidade (tabela 2). O planejamento estatal de Cingapura tem realizado um esforço para diversificar a economia do país, com destaque à indústria farmacêutica e de informática, proteção à propriedade intelectual, abertura ao comércio internacional, energia limpa e renovável, entre outros. Apesar dos impactos da crise econômica internacional de 2008 em Cingapura, especialmente no que tange às exportações e importações, houve uma importante retomada do crescimento econômico a partir de 2010, superando alguns países dos BRICS, como o Brasil, a Rússia e a África do Sul.

 

Fatores como os incentivos fiscais, financiamentos, subsídios, mão de obra qualificada e densa infraestrutura atraíram diversas multinacionais alemãs, francesas, estadunidenses, japonesas etc. para Cingapura (caso da Siemens, Alston, Panasonic, General Electric e outras), com grande agregação de valor e tecnologia à produção. O aumento da demanda por remédios e artigos industriais, sobretudo na China e na Índia, fomenta a indústria farmacêutica em Cingapura, com crescente participação nas exportações do país. Ademais, o planejamento e as inversões permitiram avanços relevantes na mobilidade, no transporte público, no abastecimento de água e no saneamento básico urbanos, com ganhos econômicos e sociais.

Nelson Fernandes Felipe Júnior

Docente da Universidade Federal de Sergipe

Núcleo de Estudos sobre Transporte (NETRANS)

A dinâmica atual do comércio exterior de Sergipe

23/08/2016 11:40

No ano de 2015, houve um saldo positivo (superávit) das transações comerciais do Brasil com outros países, totalizando 19,6 bilhões de dólares, sendo o maior valor desde 2011 (29,7 bilhões de dólares). Com a queda da atividade econômica e a desvalorização cambial, as importações reduziram 24,3% em 2015. Entre janeiro e julho de 2016, as exportações brasileiras superaram as importações, resultando em um superávit da balança comercial de 28,2 bilhões de dólares (SECEX, 2016). O arrefecimento da demanda interna é resultante, sobretudo, da diminuição dos investimentos públicos e privados e da elevação do desemprego.

 

A balança comercial do estado de Sergipe, em 2015, apresentou um déficit de 118,2 milhões de dólares, com 95,6 milhões de dólares em exportações e 213,8 milhões em importações. Em junho de 2016, a balança comercial sergipana apresentou um superávit de 590 mil dólares, com crescimento de 65,3% das exportações comparadas ao mês anterior, e retração das importações em 56,3%.

 

No acumulado de 2016 (entre janeiro e julho), as exportações totalizaram 48,1 milhões de dólares, aumentando 19,8% em relação ao mesmo período de 2015. Já as importações atingiram 80,5 milhões de dólares, o que representa uma queda de 43,3% em comparação ao mesmo período do ano passado. Dessa maneira, o saldo acumulado da balança comercial sergipana continua deficitário em 32,4 milhões de dólares no corrente ano.

 

Entre janeiro e julho de 2016, as principais vendas externas foram de sucos concentrados, produtos de alumínio, calçados e óleos vegetais, com destinos, sobretudo, à Europa e América do Sul (principalmente Holanda e Colômbia). Essas mercadorias compõem 70% da pauta exportadora do estado. No que tange às importações sergipanas, destacam-se: amônio e derivados, trigo e coque de petróleo (em conjunto responderam por 39% do total), comprados principalmente dos Estados Unidos, Argentina, Rússia, China e Marrocos (responderam por 60% do total importado por Sergipe) (SECEX; SEPLAG, 2016).

 

A dinâmica atual do comércio exterior sergipano elucida um contexto de recessão interna e externa, com redução significativa das importações especialmente nos meses de maio, junho e julho de 2016. A desaceleração da economia do estado reflete a queda na geração de empregos e renda, além do impacto negativo na demanda do setor terciário (principalmente no comércio atacadista e varejista).

 

No primeiro trimestre de 2016, a taxa de desemprego em Sergipe foi de 11,2%, aumentando em 2,6 pontos percentuais em comparação aos três primeiros meses de 2015. Comparando com os demais estados do Nordeste, a taxa registrada em Sergipe foi a quinta maior, ou seja, apresentou um desemprego menor apenas em comparação à Bahia (15,5%), Rio Grande do Norte (14,3%), Pernambuco (13,3%) e Alagoas (12,8%).

 

O crescimento das exportações sergipanas é resultado, sobretudo, da desvalorização do real frente ao dólar e ao euro, tornando os produtos brasileiros “mais baratos” no exterior. Diante do enfraquecimento da demanda interna, algumas indústrias em Sergipe estão adotando novas estratégias, ou seja, voltando-se mais ao mercado externo em detrimento do doméstico, caso, por exemplo, dos segmentos têxtil e calçadista.

 

Sergipe possui um setor portuário com reduzida modernização, eficiência e competitividade, gerando reflexos negativos na economia. Muitas exportações e importações são realizadas por portos de outros estados do Nordeste (Salvador/BA e Suape/PE, principalmente), além dos produtos industrializados oriundos, sobretudo, da Bahia, Pernambuco, Rio de Janeiro, São Paulo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul que atendem a demanda sergipana (escoados pelo modal rodoviário).

 

Como afirma Rangel (1963), o comércio exterior é imprescindível para o desenvolvimento econômico, com reflexos na produção e na demanda regional e nacional. Segundo Keynes (1982) e Rangel (1987), a insuficiência de demanda efetiva prejudica o emprego e a renda, assim, o planejamento estatal possui dupla função: a) realizar inversões em setores antiociosos (infraestruturas portuárias, por exemplo); b) estimular os investimentos privados em áreas que demandam maiores recursos.

 

Duas estratégias estatais são relevantes para mitigação dos impactos negativos dos momentos de recessão econômica, quais sejam: os investimentos em infraestruturas e a redução da taxa de juros. Tais medidas estimulam a geração de empregos e renda, o consumo (bens duráveis e não duráveis), geram demanda na indústria, fomentam os investimentos produtivos etc. Por conseguinte, potencializam-se as redes e os fluxos marítimos (cabotagem e longo curso).

 

Não obstante, o atual cenário brasileiro elucida o fortalecimento da política neoliberal, bem como um ajuste fiscal pautado na redução de gastos/inversões estatais, prejudicando a retomada do crescimento econômico e restringindo a distribuição de renda no país. A política econômica “financeirista” limita a reativação da demanda efetiva e o efeito multiplicador interno, agravando a desigualdade social e regional no Brasil.

 

Por fim, cabe destacar que alguns reflexos positivos nas exportações brasileiras e sergipanas já são observados, sendo resultado dos acordos comerciais estabelecidos principalmente no governo Dilma Rousseff, como as vendas de aviões para os Estados Unidos e Oriente Médio, exportações de veículos e bens manufaturados para o Mercosul e o México, maior inserção dos sucos de frutas brasileiros no mercado da União Europeia, entre outros.

Nelson Fernandes Felipe Júnior

Docente da Universidade Federal de Sergipe

Núcleo de Estudos sobre Transportes (NETRANS)