Bicicleta fora dos planos: mobilidade urbana em Maringá (PR)

25/11/2019 13:00

A mobilidade urbana é um tema complexo que abarca inúmeras variáveis que vão desde escolhas de Estado no que se refere aos investimentos em políticas públicas e infraestruturas, até o posicionamento da sociedade frente os novos desafios e quebras de paradigmas na utilização do carro e dos combustíveis fósseis. Seu principal problema encontra-se na rápida e desordenada urbanização que as cidades brasileiras apresentaram ao longo das décadas – sobretudo a partir de 1930 - no espraiamento e segregação socioespacial que aumentou ainda mais as distâncias e tempos de deslocamento entre trabalho e moradia (por exemplo), na escolha do veículo automotor individual como modal prioritário da vida urbana, entre tantos outros que trazem à tona a relevância em se discutir essa questão. A definição pragmática de mobilidade urbana trazida pelo MCidades (2004), nos diz que a mesma está associada à circulação de bens e pessoas, correspondendo às necessidades de deslocamento de cada indivíduo e as respostas destes frente a isto. Para tanto, o esforço do deslocamento pode ser direto (deslocamento a pé), não-motorizado (bicicletas, carroças etc.) ou motorizado (coletivo ou individual).

 

No entanto, é preciso considerar a mobilidade urbana como algo que vai além dos transportes e modos de locomoção. Segundo Cocco (2017) a mobilidade está associada às políticas que abarcam os transportes, estendendo-se para as questões de uso do solo, proximidade entre lugares, integração etc. A bicicleta, especificamente, pode se enquadrar como uma forma de mobilidade urbana ativa, considerada como um eixo da Política Nacional de Desenvolvimento Urbano (PNDU), que trata de uma maior ênfase dos modos coletivos e não-motorizados de deslocamento. De acordo com Neri, Filho e Savi (2016), em cidades médias, onde as viagens se caracterizam por serem mais curtas, a bicicleta é um meio de grande potencial nos deslocamentos urbanos, auxiliando uma grande parcela da população diariamente. Além disso, para distâncias de até 8 km, o tempo de deslocamento se assemelha muito ao de um carro. Dentro deste contexto, além de ser o veículo mais utilizado do mundo, representa uma das soluções que as cidades têm buscado para o problema da circulação e do trânsito. Neste cenário, sua utilização como meio de transporte, pode ser entendida como um ato político necessário ao debate sobre os modos de locomoção no meio urbano, sobre a humanização e equidade dos espaços, sobre o papel que cada modal representa e a quem eles devem servir. Nosso trabalho escolheu como objeto de análise a mobilidade por bicicleta, no entanto, é preciso entender que esta discussão não deve ser feita senão no âmbito de integração entre os modais disponíveis em determinada localidade - no nosso caso, o recorte espacial é o município de Maringá-PR.

 

Esta cidade, nasceu sob a lógica da colonização planejada do norte paranaense, que se deu inicialmente pela companhia inglesa Paraná Plantations Ltd e, desde sua concepção, as ações dos agentes produtores do espaço urbano estiveram presentes de modo muito intenso, especialmente na forma da especulação imobiliária impulsionada por ações do Estado. Em parte, esta característica de empreendimento imobiliário é o que implica a maneira como se desdobrou o planejamento urbano municipal em suas várias nuances, com a advento de leis, políticas públicas e infraestruturas que vêm - não raramente - ao encontro de interesses privados. Apesar de ser uma cidade moderna e planejada, com grande potencial de integração e diversificação de modais, ainda segue a velha lógica do carro como meio de transporte primordial, sendo pensada para este fim desde o primeiro esboço de plano durante a década de 1940. Suas avenidas largas e arborizadas, com amplas faixas de circulação e canteiro central com espaço suficiente para a implantação de ciclovias, receberam, antes de qualquer outra medida, um sistema binário (composto de vias de mão única e sincronização semafórica chamada de “onda verde”), confirmando mais uma vez, o usuário do modo privado de locomoção como centro dos investimentos públicos. Orgulhosa de ser uma cidade cujas instituições públicas e privadas se debruçam sobre planos estratégicos numa projeção de décadas à frente, o Plano de Mobilidade, determinado pela Política Nacional de Mobilidade Urbana - PNMU, ainda está em fase inicial de discussão em Maringá, mesmo que o terceiro prazo de prorrogação tenha finalizado em abril de 2019.

Partiu-se, portanto, da hipótese de que o município de Maringá teve, ao longo de sua história, decisões determinantes no que se refere ao planejamento urbano, sobretudo na questão da mobilidade e bicicleta como eixo central. Dessa forma, procurou-se responder ao seguinte questionamento: Qual a relação da dinâmica de mobilidade urbana do município de Maringá, seu processo de organização espacial e a atuação dos principais agentes produtores e modificadores do espaço urbano (com destaque para os agentes imobiliários e o Estado), que inviabilizam a constituição de uma matriz de transporte diversificada e acessível, e priorizam o automóvel (carros e motos) e deixando modos ativos, como a bicicleta, fora desses planos?

 
 

PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO MARINGAENSE

 

A produção do espaço urbano maringaense, está inserido dentro do contexto global e nacional, e obedece tanto às dinâmicas externas quanto os ciclos internos e os pactos de poder que fazem parte da Dualidade Básica brasileira defendida por Rangel (2005a). Dessa forma, a formação de seu território foi influenciada por fatos históricos como a II Grande Guerra, a Crise de 1929 e, dentro do Brasil, pela Revolução de 30 e as políticas nacional desenvolvimentistas de Getúlio Vargas. A questão dos transportes e da mobilidade urbana também foi influenciada por estas políticas, uma vez que se pretendia uma integração do território nacional através da confecção de malha viária representada antes pelas ferrovias e depois pelo rodoviarismo.

 

No caso de Maringá, o mesmo traçado ferroviário que deu origem ao plano inicial da cidade, foi aquele que trouxe o asfalto obedecendo a uma lógica do capital que construía cidades voltadas para o carro. Acompanhou também uma lógica tecnocrática baseada em planos e planejamentos que seguiram inicialmente as “cidades-jardins” europeias, mas, que logo se perderam para um crescimento populacional acelerado. Os principais planos diretores e legislações urbanísticas que fizeram parte da história maringaense, basearam-se não raramente nos interesses de agentes privados, sobretudo do capital imobiliário. Trazendo à tona decisões que beneficiaram determinadas classes em detrimento de outras, afastaram a pobreza das vistas de seus parques urbanos bem desenhados e, demandaram por mais transportes neste processo segregativo.

 

Com base nas formas e estruturas urbanas, implantadas ao longo do tempo, problemas como a violência no trânsito, já atingiram números maiores do que a capital paranaense, em termos relativos. A questão dos acidentes de trânsito, se analisadas sob o ponto de vista da quantidade de acidente/habitante, ultrapassa as duas maiores cidades do Estado: Curitiba e Londrina. Dessa forma, se as políticas de priorização da mobilidade continuarem voltadas para os veículos automotores individuais, como foi desde o início, teremos uma cidade média com características de metrópole, pelo menos no que se refere ao trânsito e à mobilidade.

 

Dados do Detran-PR (2019) apontam que entre 2008 e 2018 houve um aumento de 64,60% da frota de veículos na cidade[1], aumento este que continua a cada semestre e representa centenas de milhares de veículos em uma década. Nesse panorama, Maringá encontra-se com um dos maiores índices de habitantes por veículo do Estado (1,57 habitante/veículo contra índice do Paraná que é 1,32 habitante/veículo). A crescente quantidade de carros, deve-se a uma diversidade de fatores, dentre eles: às isenções fiscais sobre tal modalidade adotado pelo governo Lula em 2008 (Gráfico 1) para estimular a economia nacional num momento de crise internacional, aumento da renda e de crédito, preço equilibrado dos combustíveis, aumento do crédito, oligopolização e monopolização do transporte público com a formação de cartéis, implementação do Programa Proálcool e dos automóveis Flex. Estes fatores combinados, facilitaram a obtenção de veículos automotores por camadas da sociedade que antes não tinham acesso, mas, não previu de forma significativa o impacto do inchamento das vias que se agravaram sem a adoção de políticas de controle e fiscalização, como previu Maricato (2011) no trecho a seguir:

 

Melhoras sociais podem impactar significativamente o modo de vida urbano. O aumento do desemprego, fonte de muitos problemas sociais, é fatal para as cidades. As políticas macroeconômicas impactam a sociedade e o território. Para dar um exemplo, o comemorado aumento da produção de automóveis no Brasil em 2008 e 2010 - e consequentemente o aumento do PIB - tende a ser desastroso para as cidades. (p. 77)

 

O gráfico ainda nos aponta o número de licenciamentos total e de automóveis no Brasil de entre 1957 e 2019, indicando que nos anos de 2008 a 2012 (política de IPI reduzido e aumento de renda), houve um salto significativo na venda desses bens em nível nacional. No entanto, o índice relativo de crescimento de carro por habitante na cidade de Maringá, não demonstrou uma diferenciação tão acentuada entre as políticas dos governos FHC e Lula (Tabela 1). No primeiro deles, o poder de compra da classe média foi estimulada pela valorização do real e, uma vez que a presença dessa camada social é muito forte em Maringá, a obtenção de veículos ocorreu de forma mais ou menos intensa. No governo Lula, este poder de compra se estende para outras camadas da população, sendo maior o consumo de carros do que na gestão anterior, mas, não tão acentuada como no caso nacional.

 

Gráfico 1 – Licenciamento anual de automóveis no Brasil de 1957 a 2019.

Fonte: ANFAVEA, 2019.

Elaboração: BARBIERO, L., 2019.

Tabela 1 – Índice de crescimento do número de carros nos diferentes governos 1995-2018.

Fonte: IBGE Cidades / DETRAN-PR.

Elaboração: BARBIERO, L., 2019.

 

Obviamente, dar acesso amplo a uma classe social antes desprovida de condições de obter um dado bem, no caso o automóvel, não é o problema da mobilidade, afirmar isso, seria relacionar a manutenção da pobreza com a solução para os problemas urbanos. Segundo o documentário Mobilidade Urbana (2012), se comparado com as principais cidades dos Estados Unidos e Europa, o número de carros no Brasil é muito menor, ainda que os inúmeros problemas que circundam esta escolha sejam maiores e mais danosos. Ou seja, não se trata apenas de quantidade de carros, mas, sobretudo da qualidade das vias, sua capacidade de abarcar a maior quantidade de modais compartilhando seu espaço, a escolha correta do modal a ser priorizado e o uso racional dos veículos automotores.

 

MOBILIDADE POR BICICLETA EM MARINGÁ-PR

 

Apesar das questões apresentadas sobre mobilidade por bicicleta, temos também críticas ao modelo, no sentido de entender que existem diferenças entre aquele grupo de “privilegiados”, que segundo Monteiro (2019b) geralmente compõem o conjunto de cicloativistas das cidades e, utilizam a bicicleta como opção, e, àqueles que em sua dissertação ele categoriza como os que utilizam-na como única opção. Ou seja, locomover-se de bicicleta pela cidade para uns pode ser motivado como uma alternativa ao estresse do trânsito (bicicleta como opção) enquanto para outros, representa o meio mais barato de se locomover “e o valor economizado do petróleo garante a mistura do jantar” (MONTEIRO, 2019a, p. 32). A distinção está, quase sempre, na classe social à qual pertencem e, se a escolha de transitar de bicicleta pertence à uma decisão política, social ou econômica.

 

É importante salientar que as análises presentes neste trabalho, dizem respeito às condições apresentadas pelo município de Maringá em termos de clima, tempo de deslocamento, distâncias percorridas, relevo, entre outros. Estando assim em acordo com as potencialidades estudadas para este espaço urbano. No entanto, entendemos que a mesma conjuntura pode não ser tão facilitada em outras realidades geográficas, estando condicionadas a diversos fatores. Em metrópoles como São Paulo-SP e Rio de Janeiro-RJ, por exemplo, não se pode pensar na utilização da bicicleta sem refletir igualmente na integração com outros modais, uma vez que as distâncias percorridas são mais longas e, somente o transporte por bicicleta, pode não ser suficiente para se alcançar o destino desejado. Outros locais como Florianópolis-SC, com relevo acidentado e barreiras físicas e naturais, por vezes intransponíveis, também existe dificuldade em se utilizar a bicicleta como único modal. De acordo com Pezzuto (2002), nestes casos, o transporte cicloviário pode ser uma boa alternativa para a diminuição do número de carros, no entanto, deve ser conectado a outro modal, o que aumenta seu raio de atuação.

 

A discussão sobre mobilidade em Maringá, perpassa por uma série de questões atuais, que envolvem a revisão do Plano Diretor para os próximos 10 anos (2020-2030), a implantação do Plano de Mobilidade Urbana (em fase de assinatura de contrato licitatório) e a adoção de políticas que visem amenizar os problemas de trânsito que tem se mostrado cada vez mais acentuados, sobretudo, com relação à violência.

 

Por ser uma cidade média, com distâncias reduzidas entre um destino e outro; relativamente plana que num raio de 8 km pode-se percorrer quase todo o eixo de comércio e serviços principais (NERI, 2012); com avenidas e canteiros centrais largos, que podem comportar facilmente estruturas cicloviárias e; mais uma série de fatores, a bicicleta poderia ser melhor aproveitada como modo de transporte. No entanto, não é o que acontece.

 

Os automóveis têm crescido em quantidade e utilização, enquanto o transporte público coletivo e demais formas de locomoção perdem usuários a cada ano que passa. Sobre isto, o debate que se faz é a respeito do novo terminal intermodal e sua real funcionalidade e das possibilidades de taxa zero para o transporte público, para que se torne novamente uma opção viável para a população.

 

Defendemos que a questão central sobre mobilidade em Maringá hoje, precisa ser focada em decisões políticas no sentido de amenizar a questão da violência no trânsito, visto que Maringá, não necessariamente apresenta grandes congestionamentos, como nas grandes cidades. No entanto, o número de acidentes e mortes em decorrência do trânsito são relativamente maiores que as médias do Paraná e do Brasil, em muitos casos.

 

CICLOVIAS E CICLISTAS EM MARINGÁ

 

O número exato de ciclistas para a cidade de Maringá não foi passível de ser levantado em nenhum órgão local ou regional, uma vez que, por não possuírem registro, é difícil fazer o controle do número de bicicletas existentes e mais difícil ainda, daquelas que são efetivamente utilizadas. Nacionalmente, temos a estimativa de 70 milhões de unidades de acordo com a Abraciclo (2019).

 

Na cidade de Maringá, algumas iniciativas têm sido desenvolvidas no âmbito político para a viabilização desse tipo de mobilidade alternativa. Um exemplo, é a implantação de um terminal intermodal, que promete abarcar vários meios de transportes, integrando-os de forma sistemática. Dados da Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana de Maringá (SEMOB, 2019), confirmam a existência de uma malha cicloviária (ciclovias e ciclofaixas) de aproximadamente 37 quilômetros, sendo que 3,2 quilômetros estão em execução e mais de 14 quilômetros em fase de estudo/projeto (Figura 1).

 

O fato é que as políticas voltadas pela mobilidade por bicicleta são muito recentes e abarcam mudanças nos paradigmas nacionais trazidos tanto pela instauração do Ministério das Cidades, quanto do Estatuto da Cidade e as demais políticas que surgiram desse ideal. A evolução na produção de malha cicloviária dentro de Maringá, só ganha força de fato a partir de 2008.

 

Figura 1 - Mapa de Ciclovias de Maringá

Fonte: SEMOB, 2019.

A bicicleta dentro do Plano Diretor de Maringá parece estar em discussão na atualização do mesmo, em conjunto com a possível elaboração do PlanMob do município que, embora esteja licitado, não tem contrato assinado por parte do poder público. Este seria um fator que poderia mudar os prognósticos que temos até agora sobre este modal.

 

Segundo os questionários aplicados em 2018, temos um perfil de ciclista maringaense muito diversificado em muitos aspectos, com predominância de homens entre 21 e 35 anos. A falta de respeito dos condutores de veículos automotores, sobretudo carros, é o maior problema enfrentado por eles na condução de bicicleta em Maringá, seguido da falta de infraestrutura cicloviária, ainda que esta tenha aumentado desde 2008.

 

NOTA:

[1] A frota de veículos é representada pela totalidade de automóveis, caminhões, ciclomotores, motocicletas, ônibus, reboque, entre outros. Em dezembro de 2008 a frota maringaense cadastrada no Detran-Pr era de 203.660 veículos, em 2018 este número alcançou 315.352 veículos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABRACICLO. Associação Brasileira dos fabricantes de Motocicletas, Ciclomotores, Motonetas, Bicicletas e similares. Estatísticas de bicicletas. 16 de outubro de 2019.

COCCO, Rodrigo Giraldi. Transporte Público e Mobilidade na Região Metropolitana de Florianópolis. Florianópolis: Insular, 2017. 378 p.

DETRAN (PR) – Estatísticas de Trânsito. Disponível em: <http://www.detran.pr.gov.br/modules/catasg/servicos-detalhes.php?tema=veiculo&id=191>. Acessado em 21/11/2018.

MARICATO, Ermínia. O impasse da política urbana no Brasil. Petrópolis: RJ, Editora Vozes Limitada, 2011.

MCIDADES - Ministério das Cidades – Política Nacional de Mobilidade Urbana Sustentável. Coleções Especiais - Caderno 6, novembro, 2004. Disponível em: <http://www.ta.org.br/site/banco/7manuais/6politicanacionalmobilidadeurbanasustentavel.pdf>. Acessado em 21/11/2018.

MOBILIDADE URBANA. Direção: Rodrigo Furukawa. Argumento e Roteiro: Camila Nastari. Produção: Ana Cláudia Colagrande. São Paulo: BDT Planejamento e Comunicação, 2012. 5 vídeos (130 min.). Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=7UvsvdXObcI&list=PLQ6ZmSBKqdz98JA_8pIUN5L6Ck36pxkXA> Acesso em 31/10/2018.

MONTEIRO, Felipe Violi. Cartografias em trânsito: A mobilidade de bicicleta pela cidade. [Dissertação de Mestrado]. Programa de Pós-Graduação em Administração (PPA) - Universidade Estadual de Maringá. Maringá: Paraná, 2019a.

MONTEIRO, Felipe Violi. Entrevista concedida a Laís Barbiero. Maringá, 1 de agosto de 2019b. [Doutorando no programa de Pós-Graduação em Administração (PPA) pela Universidade Estadual de Maringá. Coordenador Geral da Ciclonoroeste].

NERI, Thiago B. Proposta metodológica para definição de rede cicloviária: um estudo de caso de Maringá. 2012. Dissertação (mestrado)-Universidade Estadual de Maringá, Programa de Pós-Graduação em Engenharia Urbana.

NERI, Thiago B.; FILHO, Solano H. B.; SAVI, Elise. A pesquisa com ciclistas como suporte ao planejamento cicloviário: Estudo em Maringá/PR, Brasil. Pluris 2016. 7º Congresso Luso Brasileiro para o Planejamento Urbano, Regional, Integrado e Sustentável - Contrastes, Contradições e Complexidades. Maceió: Recife, 5 a 7 de outubro de 2016.

PEZZUTO, C. C. Fatores que Influenciam o Uso da Bicicleta. Dissertação (Mestrado em Engenharia Urbana), Universidade Federal de São Carlos. São Carlos/SP, 2002.

RANGEL, Ignácio. Obras Reunidas de Ignácio Rangel. Rio de Janeiro: Contraponto, v. 1, 2005a.

SEMOB - Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana de Maringá. Ciclovias existentes / em execução / em projeto. Prefeitura Municipal de Maringá. Disponível em: <encurtador.com.br/opwNO>. Acesso em 24/06/2019.

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Estudo sobre a rede urbana de Santa Catarina

13/11/2019 13:00

Este texto busca apresentar, de forma sucinta, alguns apontamentos da pesquisa de doutorado que está sendo desenvolvida junto ao programa de Pós-graduação em Geografia da UFSC e, também através do grupo de estudos em Desenvolvimento Regional e Infraestruturas (Gedri). Pesquisa essa que têm como propósito caracterizar o processo de formação, configuração e dinâmica da rede urbana de Santa Catarina. Para tanto, cabe elencar que a pesquisa leva em consideração as relações econômicas, sociais e políticas historicamente e dialeticamente articuladas na escala nacional, estadual e regional, fazendo uso das categorias conceituais de rede, espaço e região.

 

Esse estudo sobre a rede urbana de Santa Catarina tem como recorte temático (rede urbana), recorte territorial (Santa Catarina) e recorte temporal (o século XVIII). Nesse sentido, os conceitos e categorias analíticas aqui utilizados são Rede (configuração territorial); Espaço (formação socioespacial); Região (configuração socio-territorial e divisão territorial do trabalho) e as interações espaciais e o papel que elas desempenham na rede urbana de Santa Catarina e na sua dinâmica.

 

Assim sendo, cabe destacar e ponderar que não é possível estudar o processo de formação da rede urbana de Santa Catarina sem que façamos um panorama da formação socioespacial, primordialmente, utilizando tal processo de formação como possibilidade metodológica para caracterizar a configuração e dinâmica da rede urbana catarinense e suas formas de interações espaciais no espaço e no tempo. Ao utilizar essa abordagem metodológica, implicar dizer que o processo de pesquisa deve necessariamente estar sustentado no método materialista histórico-dialético, sobretudo, por ser este capaz de explicar a estrutura, processo, função e forma da rede urbana de Santa Catarina e sua metamorfose no espaço e no tempo.

 

Tendo como pano teórico-metodológico o materialismo histórico dialético, a pesquisa em questão está sendo desenvolvida metodologicamente utilizando-se de dados levantados a partir de trabalho de campo, entrevistas e dados secundários. Dados esses sobre a produção industrial e agrária (mapa 01 e 02); distribuição de mercadorias; circulação de pessoas e informação; consumo com ênfase nos serviços (mapa 03).

Mapa 01: Participação da atividade industrial na composição do PIB estadual

Mapa 02: Participação da atividade agropecuária na composição do PIB estadual

 

Mapa 03: Participação da atividade de serviços na composição do PIB estadual

 
 

Por ora, a partir do mapeamento das atividades agropecuária, industrial e de serviços, pode-se inferir que a formação socioespacial gerou uma divisão territorial do trabalho e, por conseguinte a etapas de (produção, distribuição, circulação e consumo) são elementos atuantes diretamente na formação da rede urbana de Santa Catarina. O que implica dizer, que o processo de formação, configuração e dinâmica da rede urbana de Santa Catarina são consequências da acumulação desigual das forças produtivas que geraram desequilíbrios regionais, o que por sua vez, criou-se estágios distintos de desenvolvimento também das infraestruturas (transportes e comunicação) responsáveis pelo movimento circulatório do capital.

 

É partir dessa premissa que a pesquisa busca responder como os principais elementos constituintes do movimento circulatório do capital (produção, distribuição, circulação e consumo) contribuíram para a organização territorial da rede urbana de Santa Catarina ao longo da sua formação socioespacial? Nesse sentido, o estágio no qual encontra-se a pesquisa nos permite afirmar que para responder tal pergunta é necessário entender o desenvolvimento das forças produtivas e relações de produção, pois somente assim será possível compreender o desenvolvimento da atual divisão territorial do trabalho expresso de forma sucinta nos mapas anteriores. Além de identificar o processo de formação das centralidades e das hierarquias urbanas presentes no estado de Santa Catarina.

 

De tal forma que o que está sendo feito objetivamente a partir da problemática anteriormente apresentada, e a partir do conceito de rede urbana, identificar e analisar os processos socioeconômicos e a dinâmica socioespacial, forjados tanto pelas forças produtivas quanto pelas relações de produção, que propiciaram a gênese, o desenvolvimento e a atual configuração da rede urbana de Santa Catarina. O que implica, em certo sentido, buscar identificar as tipologias e topologias das centralidades e das hierarquias da rede urbana de Santa Catarina, como por exemplo, a centralidade e hierarquia dos serviços financeiros, conforme o (mapa 04) as quais de certa forma “permitidas” pelas interações espaciais e desenvolvidas ao longo da formação socioespacial catarinense.

 
 

Mapa 04: Distribuição das agencias bancárias no estado de Santa Catarina

 
 

Diante dessas breves colocações e do que foi apresenta até o momento cabe mencionar que foi possível apresentar uma caracterização das concepções teóricas conceituais sobre rede urbana, uma certa delimitação metodologia e os principais conceitos e categorias basilares para o desenvolvimento da pesquisa. Esse panorama está presente no primeiro capítulo e intitulado como Rede Urbana: Antecedentes Teóricos e suas Premissa Conceitual. O tema central desse capítulo foi destacar a construção e reflexão teórica, a qual se refere ao desenvolvimento, aprofundamento bibliográfico e caracterização conceitual sobre o recorte temático. Também foi apresentado os apontamentos da divisão produtiva do presente como resultado da acumulação histórica, desigual e combinada, que por sua vez, caracterizam os indicativos da configuração da rede urbana atual e sua dinâmica.

 

Foi apresentado no segundo capítulo da tese a formação socioespacial e os apontamentos da rede urbana de Santa Catarina. Nessa etapa foi levantado o papel do Estado na construção das infraestruturas e no desenvolvimento dos setores produtivos além das atividades econômicas catarinense. Essa parte da pesquisa resultou em um capítulo intitulado como Formação Socioespacial como Categoria Teórica Metodológica, e os Apontamentos da Rede Urbana de Santa Catarina. O que cabe mencionar a partir desse capitulo é que o processo de formação socioespacial e a formação da rede urbana de Santa Catarina, são produtos do desenvolvimento capitalista desigual e combinado das forças produtivas e das relações de produção.

 

De modo geral, falar em rede urbana ou em redes geográficas, há que se considerar a divisão territorial do trabalho, as etapas da produção, da circulação, do consumo, o papel que a comunicação, o setor do comércio e serviços atuam na formação e dentro desta rede, sobretudo, cabe destacar que não é possível falar em rede urbana sem levar em consideração as formas de interações espaciais presente sobre o território aqui estudado. Portanto, falar em centralidades urbanas, passa necessariamente pelo o papel que esse centro desempenha em algumas das etapas do capitalismo, de tal modo que o processo de desenvolvimento do capitalismo e sua reprodução produz uma configuração espacial, que nesse caso, pode ser expressa via rede urbana.

 

De forma que definir qual rede urbana existe atualmente em Santa Catarina sua configuração e hierarquia urbana é algo que passa pela análise dos fluxos e quais tipos, além da sua intensidade sobre o território. Fluxos esses possível de ser mensurado a partir das formas e do papel que as interações espaciais desempenham sobre o território e na formação da rede urbana catarinense. De sorte que caracterizar à hierarquia urbana, é caracterizar o papel e importância que as formas de concentração espacial urbana, a integração e fragmentação territorial e interação espacial (ou demanda por mobilidade e conexões), quais caracterizam os fluxos entre pontos fixos situados em distintas localizações em uma cidade ou em cidades diferentes.

 

Assim, descrever qual configuração e rede urbana existe em Santa Catarina e sua Dinâmica, é algo que passa necessariamente pelo papel que o capital em suas mais variadas formas e modo de acumulação, necessita em algum momento fixar-se, ao longo da história, no espaço e no tempo de forma desigual, fazendo com que tenhamos cidades com as mais variadas funções e importância na rede urbana. O que constrói a hierarquia (ou ordem das cidades) que descreve as “leis” da organização no espaço urbano ampliado, isto é, no conjunto de cidades que se articulam nas mais distintas escalas.

 

Por fim, o que se pode inferir até o momento é que os elementos constituintes do movimento circulatório do capital (produção, distribuição, circulação e consumo) e seu processo de evolução atuaram e atuam diretamente na organização territorial de Santa Catarina e, por conseguinte, na formação e configuração da rede urbana que passam necessariamente pelo processo de desenvolvimento das forças produtivas e das relações de produção e pelas formas de interações espaciais geradoras de centralidades e de hierarquias urbanas no estado catarinense.

 
 Por Rafael Matos Felácio, Doutorando do PPGG/UFSC.
 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Homepage:<http://www.sef.sc.gov.br/relatorios/dior/boletim-de indicadores-econômico-fiscais> Acesso em: julho 2018.

IBGE. https://cidades.ibge.gov.br/ <acessado em julho de 2017>.

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O patrimônio cultural ferroviário no Ramal São Francisco: da formação das cidades até as recentes reestruturações

10/11/2019 13:00

O início da exploração da malha ferroviária no Brasil data-se do ano de 1852, ainda no período imperial, conforme dados do Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes (DNIT, 2018), onde cita o Decreto n.º 641 de 26 de junho de 1852, que propunha vantagens, isenções e garantias aos investidores nacionais e estrangeiros. Este movimento teve como início a necessidade de escoar com maior facilidade a produção agrícola dos Estados para as regiões portuárias. Conforme Carrion (2015), a partir da instalação das primeiras ferrovias no país, a expansão ferroviária deu-se de forma rápida. Ainda, segundo o autor, estima-se que em 1907 a malha ferroviária atingia 17.280 quilômetros, transportava 35 milhões de passageiros e 7,5 milhões de toneladas de carga. Estes números demonstram o grande potencial econômico do meio de transporte, devido a sua utilização para o transporte de pessoas e escoamento da produção agrícola e extrativista. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 1957), o sistema ferroviário no Brasil chegou a aproximadamente 38 mil quilômetros de extensão, sendo considerada a 8ª maior ferrovia do mundo.

 

A ferrovia é concluída na região nordeste do estado de Santa Catarina no ano de 1910, com ramal que fazia parte da Estrada de Ferro São Paulo Rio Grande (EFSPRG) conforme retratado por Henkels (2005) “[...] na concessão original (da EFSPRG) se previam dois ramais laterais, um para Guarapuava PR e outro que buscasse algum porto no estado de Santa Catarina a ser definido”. O porto escolhido foi o de São Francisco do Sul, então em 1903 começam os estudos para construção do Ramal São Francisco, que partiria “[...] de Rio Negro, no Estado do Paraná, atravessaria a Serra Geral (atual Serra do Mar), passando por Joinville, em busca de um porto na baía de São Francisco.” (HENKELS, 2005). A obra era vista com bons olhos pela população, que a compreendia como um instrumento de desenvolvimento, sendo que a estrada de ferro mudou as características sócio-econômicas da região levando, inclusive, a criação de municípios como Jaraguá do Sul, que antes era distrito de Joinville.

 

Figura 1: Estação Ferroviária de Jaraguá do Sul, Terminal de Passageiros em 1962.

Fonte: Acervo de Ergon Arno Krepsky

A RFFSA foi criada em 1957, através da Lei nº 3.115, de 16 de março de 1957, com o objetivo principal de promover e gerir os interesses da União no setor de transportes ferroviários. Além disso, a empresa seria responsável por resolver conflitos referentes à falta de integração das malhas ferroviárias brasileiras, que:

 

Estavam voltadas à exportação de produtos primários, eram desarticuladas entre si, atendiam a interesse privados localizados, não seguiam parâmetros técnicos comuns (do que a diferença de bitolas é a expressão mais óbvia) o que dificultava a integração física entre as diferentes malhas e aumentava os custos de operação, devido à necessidade de sucessivos transbordos de cargas (CARRION, 2015).

 

Com isso, a partir da década de 1960, o transporte ferroviário começa a sofrer um declínio em todo o país, Santos e Silva (2015) afirmam que isso deu-se devido a substituição dos investimentos na área pelo investimento no transporte rodoviário, que apesar de mais custoso a longo prazo, exige menos investimentos para sua aplicação. Telles (2011) declara que esta mudança ocorre principalmente após a instalação da primeira indústria automobilística no país. Com a popularização do transporte rodoviário e o investimento feito na construção de estradas (como a BR-101 e BR-280) o transporte de passageiros por ferrovias começa a sofrer um processo gradativo de abandono “[...] com a diminuição dos passageiros e cargas, com a competitividade do transporte rodoviário e com a diminuição dos investimentos do Governo Federal” (JULIO e SILVEIRA, 2016).

 

Entre os anos de 1996 e 1998, o modelo ferroviário brasileiro foi segmentado em seis malhas regionais, concedendo a empresas privadas o direito de exploração das malhas pelo período de 30 anos. Com isso, a RFFSA foi dissolvida através do Decreto nº 3.277, de 7 de dezembro de 1999.

 

Com a extinção da RFFSA, a maioria das estações foram fechadas por falta de utilidade na operação para o transporte de cargas, processo que levou à deterioração gradativa dos prédios, devido ao esquecimento e invasões recorrentes, representando uma ameaça iminente ao desaparecimento de importantes exemplares do Patrimônio Cultural Ferroviário.

 

Figura 2: Estação Rio Vermelho em São Bento do Sul em 2018

Fonte: Acervo de Anthar C. Hartmann

O Conceito de Patrimônio Cultural surge em 1988 na Constituição Federal, em seu Artigo 2016 que ampliou o conceito de patrimônio estabelecido pelo Decreto-lei nº25, de 30 de novembro de 1937, substituindo a denominação de Patrimônio Histórico e Artístico por Patrimônio Cultural Brasileiro. Essa alteração incorporou o conceito de referência cultural a definição dos bens passíveis de reconhecimento, sobretudo os de caráter imaterial

 

Com a necessidade de nomear-se um órgão para ser o responsável pelo espólio da extinta RFFSA, Prochnow (2014) afirma que a Lei nº 11.483 de 31 de maio de 2007 foi responsável por atribuir ao IPHAN a responsabilidade pela preservação dos cerca de 50 mil bens móveis e imóveis:

 

Art. 9o Caberá ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN receber e administrar os bens móveis e imóveis de valor artístico, histórico e cultural, oriundos da extinta RFFSA, bem como zelar pela sua guarda e manutenção (BRASIL, 2007).

 

Ao fazer uma análise superficial da estrutura das cidades do nordeste de Santa Catarina, já é possível perceber a importância histórica da ferrovia e sua relevância na compreensão da morfologia urbana dos municípios por onde passa. A malha ferroviária é um dos principais estruturadores de formação das cidades. É quase impossível encontrar áreas onde as estações não estejam em regiões urbanas ou de pequenas centralidades, desenvolvidas predominantemente durante o período de utilização das linhas para o transporte de passageiros.

 

Como exemplo claro deste processo, podemos usar o município de Jaraguá do Sul, que teve o início de sua ocupação às margens do rio Itapocu. Com a instalação das estações ferroviárias (uma no atual bairro Centro e outra no atual bairro Nereu Ramos) a ocupação da cidade começa a se desenvolver naquelas regiões, incentivando a formação de centros comerciais e de serviços conforme retratado por Costa (2015) ao afirmar que “[...] a estrutura influenciou a vida social de Jaraguá do Sul. O local também era um ponto de encontro da comunidade”.

 

Sendo assim, deve-se considerar a ferrovia e os bens móveis e imóveis provenientes de sua exploração, principalmente no século passado, parte da dinâmica social de diversas cidades, ao ocupar papel importante na memória de seus habitantes. Porém, ao realizar pesquisas de publicações sobre o assunto, é possível perceber a falta de documentos que comprovem esta relação, o Patrimônio Cultural Ferroviário encontra-se em risco. Atualmente existe dificuldade por parte do IPHAN em gerir e garantir a manutenção dos bens imóveis, sem contar o problema relacionado aos bens móveis que correm grande risco de desaparecer como retratado por Xavier e Constantino (2017, p. 162):

 

Em relação às cidades que possuem esse acervo, sabemos que existe um rico conjunto de edificações ferroviárias que merece atenção e ações efetivas dos órgãos de preservação municipais e estaduais, visto que muitos edifícios ainda estão abandonados, alguns deles na zona rural, sendo necessárias medidas urgentes de restauro e conservação, evitando assim maiores perdas deste patrimônio.

 

Este projeto visa enfatizar a importância da ferrovia como instrumento transformador do espaço. Ao mapear a estrutura urbana no entorno das edificações de patrimônio ferroviário na região nordeste do Estado, será possível esclarecer para as futuras gerações a importância destes no processo de desenvolvimento das cidades. Além disso, ao propor este estudo será possível ter uma visão do patrimônio ferroviário no região de forma menos generalista, garantindo o respeito às suas particularidades sócio-econômicas.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

ANTF. Associação Nacional dos Transportes Ferroviários: Histórico. Histórico. Disponível em: <http://www2.antf.org.br/historico>. Acesso em: 06 mar. 2018.

 

BRASIL. Decreto nº 3277, de 07 de setembro de 1999. Dispõe sobre a dissolução, liquidação e extinção da Rede Ferroviária Federal S.A. - RFFSA. . Brasília, DF.

 

_____. Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes. Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes. Ferrovias. Disponível em: <http://www1.dnit.gov.br/ferrovias/historico.asp>. Acesso em: 17 set. 2018.

 

_____. Lei nº 3115, de 16 de março de 1957. Determina a transformação das empresas ferroviárias da União em sociedades por ações, autoriza a constituição da Rede Ferroviária S.A., e outras providências. Brasília, DF,

 

_____. Lei nº 11483, de 31 de maio de 2007. Dispõe sobre a revitalização do setor ferroviário, altera dispositivos da Lei no 10.233, de 5 de junho de 2001, e outras providências. Brasília, DF,

 

_____. Decreto nº 641, de 26 de junho de 1852. Autoriza o Governo para conceder a huma ou mais companhias a construção total ou parcial de um caminho de ferro que, partindo do Municipio da Côrte, terminar nos pontos das Províncias de Minas Geraes e S. Paulo, que mais convenientes forem. Leis do Império do Brasil - 1855. Rio de Janeiro, RJ,

 

CARRION, Raul. As ferrovias como instrumento de desenvolvimento nacional. 2015. Disponível em: <http://www.vermelho.org.br/coluna.php?id_coluna_texto=7225&id_coluna=147>. Acesso em: 05 set. 2018.

 

CASTELLS, Alicia Norma González de; NARDI, Letícia. Patrimônio Cultural e Cidade Contemporânea. Florianópolis: Editora da Ufsc, 2012. 280 p.

 

COSTA, Cláudio. Antigamente em Jaraguá do Sul: os primeiros dias da Estação Ferroviária. 2015. Disponível em: <https://poracaso.com/estacao-ferroviaria-jaragua-do-sul-historia-antigamente/>. Acesso em: 17 set. 2018.

 

European Federation of Museum & Tourist Railways. Carta de Riga Riga: Fedecrail, 2005.

 

HENKELS, Henry. Canal do Linguado. 2005. Disponível em: <https://sites.google.com/site/hhenkels/canal_linguado-1>. Acesso em: 17 set. 2018.

 

IPHAN. Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Portaria nº 407, de 21 de dezembro de 2010. Dispõe sobre o estabelecimento dos parâmetros de valoração e procedimento de inscrição na Lista do Patrimônio Cultural Ferroviário, visando à proteção da memória ferroviária, em conformidade com o art. 9º da Lei n.º 11.483/2007. Brasília, DF,

 

IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. . Ferrovias do Brasil. Rio de Janeiro: Ibge, 1956. 193 p. Disponível em: <https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/biblioteca-catalogo?view=detalhes&id=293301>. Acesso em: 05 set. 2018.

 

JULIO, Alessandra dos Santos; SILVEIRA, Márcio Rogério. As estradas de ferro em Santa Catarina: Evolução, projetos e contradições. In: SILVEIRA, Márcio Rogério (Org.). Circulação, transportes e logística: No estado de Santa Catarina. Florianópolis: Insular, 2016. p. 139-174.

 

MORAES, Ewerton Henrique; OLIVEIRA, Eduardo Romero. O Patrimônio Ferroviário nos Tombamentos do Estado de São Paulo. Revista Memória em Rede. Pelotas, p. 18-42. 10 jan. 2017.

 

RFFSA. Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima. Histórico da Extinta RFFSA. Disponível em: <http://www.rffsa.gov.br/principal/historico.htm>. Acesso em: 02 mar. 2018.

 

ROSSI, Aldo. A arquitetura da cidade. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001. 309 p.

 

SANTA CATARINA. Sie - Secretaria de Estado da Infraestrutura. Sie - Secretaria de Estado da Infraestrutura. Ferroviário. Disponível em: <http://www.sie.sc.gov.br/conteudo/ferroviario>. Acesso em: 03 set. 2018.

 

SANTOS, Adauto Rocha dos; SILVA, Helder Antônio da. Modais de transporte rodoviário e ferroviário: comparativo de viabilidade para escoamento de carga de uma multinacional produtora de cimento e agregados. Sodebras, S.i., v. 115, n. 10, p.91-96, jul. 2015.

 

The International Committee for the Conservation of the Industrial Heritage. Carta de Nizhny Tagil Sobre o Patrimônio Industrial. Nizhny Tagil: Ticcih, 2003. 14 p.

 

XAVIER, Janaina Silva; CONSTANTINO, Marta da Silva. A construção do patrimônio ferroviário: uma análise do reuso da Estação Ferroviária de Mogi Mirim - SP. Museologia e Patrimônio, Rio de Janeiro, v. 1, n. 10, p.145-165, jan. 2017.

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Na periferia de São Paulo (SP), morte chega 20 anos mais cedo que em bairros ricos

09/11/2019 13:00

Quem vive na Cidade Tiradentes, no extremo leste de São Paulo, morre em média 23 anos mais cedo que um morador de Moema, bairro com um dos metros quadrados mais valorizados da capital. Os dados, a que a Agência Pública teve acesso, são parte do Mapa da Desigualdade 2019, publicação da Rede Nossa São Paulo, que compara indicadores dos 96 distritos da capital paulista. As informações são baseadas nos óbitos registrados em 2018, informados pela Secretaria Municipal de Saúde.

 

Figura 1: No distrito de Vila Andrade, onde fica Paraisópolis, a idade média ao morrer é de 63,6 anos. O Distrito é vizinho do Morumbi, onde os moradores morrem, em média, 10 anos mais velhos – aos 73,5

Créditos: Agência Pública

A principal causa de morte na Cidade Tiradentes, segundo os dados mais atuais da própria secretaria (2017), foram doenças do aparelho circulatório, que representam quase um terço do total de óbitos (32%). Já em Moema, o principal motivo foram tumores (28% das mortes). Além disso, entre os dois bairros há uma diferença significativa entre as mortes por causas externas, que incluem acidentes e mortes violentas: na Cidade Tiradentes, 11% das mortes ocorreram nessa categoria; já em Moema, essas mortes não chegam a 5% dos casos.

 

O abismo da média de idade ao morrer se repete por toda a São Paulo: em distritos da periferia paulistana como Marsilac, Grajaú, São Rafael, Anhanguera e Jardim Ângela, pessoas morrem cerca de 20 anos mais jovens do que em vizinhanças consideradas “ricas”, como Santo Amaro, Itaim Bibi, Alto de Pinheiros, Consolação e Jardim Paulista.

 

Créditos: Agência Pública

Assim como na Cidade Tiradentes, em todos os demais cinco distritos da periferia de São Paulo onde se morre mais cedo (Marsilac, Grajaú, São Rafael, Anhanguera e Jardim Ângela), a principal causa de morte são doenças do aparelho circulatório. Em Marsilac, mortes por causas externas – que incluem mortes violentas e causadas por acidentes – representam quase 18% do total; no Jardim Ângela, foram 12% dos óbitos; no Grajaú, 11%.

Já nos bairros “ricos” (Santo Amaro, Itaim Bibi, Alto de Pinheiros, Consolação e Jardim Paulista), as mortes por causas externas são bem menos frequentes: em nenhum dos cinco bairros elas passam os 5,6%.

 

INFO 2

Créditos: Agência Pública

 

Os dados do Mapa da Desigualdade ainda apontam que a idade média ao morrer na cidade de São Paulo, como um todo, caiu entre 2017 e 2018 e os paulistanos passaram a morrer quase um ano mais jovens. Nesse período, os dados pioraram em quase todos as regiões da cidade: dos 96 distritos analisados, 87 indicaram uma idade média ao morrer menor em 2018 que em 2017. A maior queda foi em Jaguara, distrito na zona oeste da cidade, entre as rodovias Anhanguera, Castelo Branco e a Marginal do Tietê. Lá, a idade média ao morrer caiu seis anos entre 2017 e 2018.

Em bairros onde vivem mais negros, morte ocorre mais cedo

 

Os dados revelam também que, em São Paulo, a idade ao morrer está diretamente ligada à cor da pele: Moema, onde se morre mais velho, é também o distrito mais branco da cidade – segundo o Censo 2010, a população negra em Moema era de apenas 5% do total de moradores. No outro extremo, na Cidade Tiradentes, negros são 56,1% dos moradores, mais da metade da população do distrito.

 

No mapa, a desigualdade entre negros e brancos é evidente: todos os cinco distritos onde mais moradores se declaram negros estão na periferia – Jardim Ângela, Grajaú, Parelheiros, Lajeado e Cidade Tiradentes. E em todos a idade média ao morrer não passa dos 60 anos, bem abaixo da média da cidade, que é de 68,7. No outro extremo, os cinco distritos com menor população negra – Moema, Alto de Pinheiros, Itaim Bibi, Jardim Paulista e Vila Mariana – têm uma média de idade ao morrer acima dos 78 anos.

 
 

Os dados não surpreendem Maria Auxiliadora Chaves da Silva, que mora há 23 anos na Cidade Tiradentes. Para ela, que, além de assistente social, é ativista de grupos de mulheres e membro do Conselho Municipal de Saúde, morre-se mais jovem na Cidade Tiradentes por uma série de fatores, que vão desde a dificuldade de acesso ao atendimento médico à precarização do trabalho, violência policial, racismo e machismo na sociedade e a ineficiência de políticas públicas, que não atendem quem mais necessita.

 

“São vários fatores, há um contexto por trás dessas mortes. Uma delas é a questão econômica: sem trabalho, como você garante um direito básico que é uma alimentação de boa qualidade? E na periferia, quando se consegue um trabalho, ele costuma ser precarizado. Na maioria dos casos aqui, as pessoas têm muito mal um ensino médio completo, muitas têm apenas fundamental e há as que nem estudo têm. Vive-se para pagar as contas básicas e não sobra para o resto”, avalia.

 

Segundo os dados do Mapa da Desigualdade, é na Cidade Tiradentes onde está o pior índice de emprego formal de São Paulo. Moema, para se ter uma ideia, tem um índice 40 vezes maior que o da Cidade Tiradentes. Nos três bairros com piores índices de emprego formal — Cidade Tiradentes, Iguatemi e Anhanguera —, mais da metade da população se declarou negra.

 
 

Maria Auxiliadora comenta como é comum que moradores do bairro madruguem nas filas para conseguirem agendar consultas médicas, que costumam levar meses para serem realizadas. “Às vezes você espera seis meses, um ano. Conheço pessoas que faleceram sem conseguir uma consulta”, comenta. Para ela, a desigualdade social na Cidade Tiradentes traz um peso ainda maior para mulheres, que acumulam funções ao trabalhar e cuidar da casa e dos filhos. “Para as mulheres, a realidade é ainda pior, pela sobrecarga de cuidar da casa. Muitas são arrimo de família e não têm tempo para cuidar delas mesmas, da saúde física ou da mental”, aponta.

 

Na avaliação do médico e professor de patologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) Paulo Saldiva, a desigualdade na idade média ao morrer entre bairros “ricos” e a periferia é explicada, em grande parte, pela dificuldade que pessoas com renda mais baixa têm para se dedicarem a cuidar da própria saúde.

 

“A grande dificuldade hoje é na possibilidade que as famílias têm de cuidar dos mais frágeis. Com a precarização do trabalho, trabalha-se muitas horas por dia, e daí as pessoas ficam impossibilitadas de cuidarem de si próprias, ou de quem depende de seus cuidados. Em uma das últimas aulas que dei na Faculdade de Medicina, relatei um caso de uma senhora de 46 anos obesa e diabética. Ela teve gangrena de um dos dedos do pé. Não sei se ela não teve acesso ao atendimento médico ou a família não teve como cuidar, mas ela amputou o próprio dedo em casa, moradora da periferia de São Paulo. É por aí que estamos”, conta.

 

Saldiva afirma que a dificuldade de transporte e a falta de estabelecimentos de saúde nas periferias agravam mortes que poderiam ser evitadas. “Muitas vezes a dificuldade de se chegar a um lugar é determinante. Cerca de 35% das pessoas que morrem de doenças cardiovascular teriam seu destino diferente se tivessem atendimento nas primeiras duas horas.”

 

Autor: Bruno Fonseca

@obrunofonseca

 

Fonte da Reportagem: https://apublica.org/2019/11/na-periferia-de-sao-paulo-morte-chega-20-anos-mais-cedo-que-em-bairros-ricos/?fbclid=IwAR2bzIVv0XsjpKgASoBCQMeJdJbiHfEJZ888ABMYOH_LZK0pmqjYDsrN89Q

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Os impasses do planejamento da mobilidade na Região Metropolitana de Florianópolis (RMF)

07/11/2019 13:00

Passados cinco anos da realização do estudo do Plano de Mobilidade Urbana da Região Metropolitana de Florianópolis (PLAMUS) de 2014, sob encomenda do estado de Santa Catarina, observa-se que poucas soluções foram colocadas em marcha no sentido de solucionar os problemas de mobilidade na região. Os estudos de origem-destino; sobe-e-desce; contagem de tráfego; frequência e ocupação visual, e outros, foram reveladores do quadro de deterioração geral das condições de mobilidade, mas sua operacionalização na forma de políticas públicas tem esbarrado em contradições que envolvem o próprio Estado e os blocos de poder nele entronizados. Assim, os projetos e as capacidades institucionais de realizá-los, tem incorrido em visíveis retrocessos.

 

O plano concebido no ano de 2015, de integrar a Região Metropolitana de Florianópolis através de um sistema BRT (Bus Rapid Transit) foi substituído recentemente por uma proposta de integração ainda mais conservadora que o próprio BRT. Enquanto isso, infraestruturas pontualmente construídas no decorrer do último quadriênio, como por exemplo, a duplicação da SC-403 efetuada em 2017, não tem surtido o efeito desejado. O fato é que apesar das ampliações viárias, a inexistência de corredores exclusivos para transporte público (Figura 1) tem piorado significativamente as condições de mobilidade. Ademais, a construção de novos empreendimentos nas extremidades dos bairros – sem a devida qualificação urbanística, tais como Comprefort e Havan, no Norte da Ilha –, bem como em eixos usados para deslocamento pendulares, como os empreendimentos da “Rota da Inovação”, na rodovia SC-401, tem aumentado o volume de automóveis em espaços não qualificados para tal.

Figura 1 – Congestionamento na rodovia SC-401 após duplicação e sua afetação sobre os transportes públicos, em 2018.

Fonte: https://ndmais.com.br/noticias/buraco-na-sc-401-provoca-mais-de-oito-quilometros-de-congestionamento-em-

Ao mesmo tempo, os sistemas de transporte público da região têm exibido uma persistente deterioração em suas taxas de renovação de passageiros e condições de execução de sua logística corporativa, entre outros problemas decorrentes da dispersão urbana regional combinada à inação do Estado. Exemplo disso é a utilização de veículos intermediários aos ônibus articulados – os ônibus “15 metros” –, nos horários de entre-picos, visando a reduzir custos operacionais crescentes. Assim, a ausência de um planejamento público que integre serviços de transportes, uso do solo e infraestruturas, dá lugar a estratégias e tecnologias voltadas à logística corporativa, que não se revertem em melhoras nas más condições de mobilidade – ou, quando muito, amenizam muito timidamente essas más condições –, para o usuário.

 

Nesse contexto, considerando a ineficácia das instituições públicas de planejamento da mobilidade metropolitana na região, cabe questionar: quais são os principais aspectos condicionantes dessa ineficácia? O primeiro fato a ser destacado remete ao aprofundamento histórico do neoliberalismo no planejamento, consubstanciado na vitória ideológica dos “neo-localismos competitivos”, provenientes da ausência de um pacto federativo que consubstancie objetivos de planejamento e desenvolvimento nacional/regional (VAINER, 2007). Assim, como expõe Rangel (2005), a atividade de planejamento não se pode fazer em quaisquer condições, mas apenas em sociedades estáveis, conscientes de sua unidade e socialmente coesas. Nesse caso, as dualidades que historicamente compõem a sociedade e o Estado no Brasil teriam que desaparecer, dando lugar a uma maior homogeneização da sociedade, mas isso não ocorreu (RANGEL, 2005).

 

Nessa lógica, ao mesmo tempo em que historicamente se delegaram poderes e responsabilidades aos estados e municípios, não houve uma promoção da cooperação entre eles e tampouco houve garantia de recursos contínuos a esses entes. Assim, instituições desconcentradas – ou “devolvidas” (MACKINNON et al, 2010), como expressa a literatura internacional –, ao contrário dos casos europeus, no caso brasileiro foram, na verdade, esvaziadas de suas capacidades reais de planejar. É o que temos visto no caso catarinense.

 

Nesse processo, antigos órgãos de planejamento catarinenses, cujas competências e capacidades eram promissoras no sentido de solucionar e encaminhar questões candentes do território, foram sendo extintos ou substituídos por Secretarias de Estado, com grande volume de cargos comissionados e poucos técnicos de carreira. O Instituto Técnico de Economia e Planejamento - ITEP (1979), o Gabinete de Planejamento - GAPLAN (1983), entre outras, foram iniciativas contundentes que atuaram como vetores de execução de projetos, além de acumularem dados significativos sobre o território, com fins de planejamento. Estas foram extintas no decorrer de mudanças de governo.

 

O GAPLAN, por exemplo, criando durante o governo Jorge Bornhausen, 1979-1982, surge de uma estrutura de perfil técnico, proveniente de outra instituição igualmente operativa: o Instituto Técnico de Estatística e Planejamento (ITEP), que data do Governo Antônio Carlos Konder Reis, 1975-1979. O GAPLAN possuía subchefias especializadas e setorizadas, para a elaboração de trabalhos de geografia, cartografia, identificação e demarcação de limites territoriais intermunicipais e distritais, bem como para a realização de estudos de geografia regional. Ademais, dava suporte específico ao planejamento nos municípios e questões ligadas ao meio ambiente (dando origem à FATMA). Durante a devastação do estado pelas enchentes de 1983, foi o PROURB, de iniciativa do GAPLAN, que recuperou 70% das estradas destruídas.

 

O fato é que no período posterior à redemocratização, observou-se no Brasil e também em Santa Catarina, um processo de desmontagem das instituições de planejamento mais ativas. O GAPLAN, por exemplo, foi extinto pelo então governador Vilson Pedro Kleinübing (1991-1994), que redirecionou parte de seus técnicos à Secretaria do Planejamento e Fazenda. Ao mesmo tempo, foram efetuadas “devoluções” de competências aos municípios, que – salvo algumas exceções– não significaram um aumento da capacidade de planejar. As novas atribuições incorporadas pelos municípios, seguidas de uma capacidade de investimento declinante, só sucateou ainda mais as instituições pré-existentes.

 

A história do Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis (IPUF), criado em 1977, exemplifica bem esses problemas. O IPUF não se converteu em uma “rótula de concertação” com atuações metropolitanas, nem tampouco avançou em termos de capacidades técnicas de execução, muito embora a lei de criação do instituto já previsse a extensão de suas atribuições de planejamento ao conjunto da Grande Florianópolis.

 

O fato contundente é que apesar de surgir como uma iniciativa promissora, o órgão foi sendo sufocado. Nota-se que a autarquia estagnou em termos de pessoal, sendo que praticamente os mesmos técnicos contratados na década de 1970 prosseguiram na instituição. Muitos deles aposentaram e não houve substituição, o que era observável pela grande presença de estagiários e poucos técnicos de carreira. Entre os anos de 2005-2012 – dando continuidade a em um processo de desmonte que se iniciou anteriormente a ele – houve um enfraquecimento do órgão. No período, a autarquia já não conseguia fazer avançar nenhum processo licitatório, bem como houve retirada de atribuições, direcionadas novamente a uma secretaria: a Secretaria de Meio Ambiente e de Desenvolvimento Urbano de Florianópolis. Assim, além de uma desmontagem efetuada na esteira do avanço neoliberal, observa-se um certo sentido estratégico de controle do Estado, por parte das elites regionais: retiram-se atribuições das mãos de técnicos de carreira e planejadores, colocando essas atribuições em mãos de cargos comissionados em secretarias, como forma de atender a barganhas políticas.

 

As descontinuidades que penalizaram o IPUF se refletiram na própria estruturação do Sistema Integrado de Transportes de Florianópolis (SIT), como resultado de conflitos políticos entre os grupos de poder regionais e da ausência de uma autarquia metropolitana pré-existente. O SIT, desde sua concepção, já expressava as dificuldades de integração de trabalho metropolitana. Inicialmente, o sistema inspirou-se na RIT (Rede Integrada de Transportes) da Região Metropolitana de Curitiba, sem, no entanto, estruturar-se dentro de uma institucionalidade metropolitana. O SIT, concebido durante a administração da prefeita Ângela Amin (1997-2005) – antecessora de Dário Berger –, não avançou no sentido de um sistema metropolitano por um conjunto de problemas estruturais que advieram. O primeiro que pode ser citado é a descontinuidade política e institucional. Assim, podemos elencar como fatores: a ausência de uma personalidade jurídica que integrasse de fato a região; a falta de recursos para desapropriação e construção de terminais em locais adequados; recursos para a manutenção contínua da atividade de planejamento e; falta de integração de trabalho entre as prefeituras da região e o estado.

 

Atualmente, a instituição incumbida da tarefa de planejar a mobilidade urbana regional é a Superintendência de Desenvolvimento da Região Metropolitana de Florianópolis (Suderf). A lei estadual 636 de 2014, que instituiu a Suderf, expressa seu objetivo de gerir o serviço de interesse comum da Região Metropolitana de Florianópolis, mediante a celebração de convênios com os municípios.

 

O fato contundente é que a Suderf convocou os prefeitos à assinatura do convênio em um momento no qual apenas se realizava a primeira reunião do Coderf (Conselho de Desenvolvimento da Região Metropolitana de Florianópolis), do qual faz parte o Colégio de Prefeitos. Mas o ponto nevrálgico do debate, que desacelerou o processo, foi a proposta do estado de adquirir competências – normalmente municipais – de arrecadação mediante cobrança de multas e estacionamento, fato que, aliado à incerteza no horizonte dos investimentos estaduais e federais gerou reações negativas por parte das prefeituras em relação às ações do governo. O fato é que os municípios esperavam investimentos em novos terminais de integração e em corredores exclusivos.

 

No final de 2018, o então governador em exercício Eduardo Pinho Moreira (abril a dezembro de 2018) – que substituiu Raimundo Colombo, que deixou o governo para disputar as eleições – retirou o projeto de lei do convenio interfederativo da Assembleia Legislativa de Santa Catarina, bloqueando um processo que havia avançado significativamente. A próxima etapa já seria a da licitação do sistema, bem como a promoção de uma Parceria Público Privada para viabilizar os novos terminais de integração – 2 novos terminais na área continental –, assim que o convenio passasse pelas câmaras municipais. Assim, houve uma desaceleração no momento em que os necessários ajustes interinstitucionais já haviam avançado, isto é, o momento mais oportuno para o aprofundamento do processo. Finalmente, no Governo Carlos Moisés da Silva, (2018-atual), tem havido uma perda de centralidade da questão metropolitana, com todos os processos ocorrendo sem grande ação deliberada das partes interessadas. Inclusive, a Suderf, que estava entre as autarquias que seriam extintas pelo governo, só não foi totalmente desmontada devido a ações de convencimento de parte da sociedade civil e de técnicos de carreira que contribuíram, desde o início, para a sua construção.

 

O CONSERVADORISMO DOS NOVOS PROJETOS PARA A MOBILIDADE URBANA REGIONAL

 

Quando se fala em conservadorismo no planejamento da mobilidade, um dos primeiros aspectos que devem ser considerados é a falta de diretrizes e capacidades, no planejamento, para a integração entre uso do solo e transportes; a geração de emprego e renda em espaços periféricos; o estimulo aos usos mistos do solo e; a implantação de novas tecnologias e infraestruturas mistas de transporte. Tais temas têm sido debatidos, nos últimos anos, como sendo objetivos importantes que deveriam ser almejados na Região Metropolitana de Florianópolis. Dentre esses temas, considerando as dificuldades políticas de se manejar a questão da terra urbana na região, acabou por destacar-se o objetivo de implantação de um Bus Rapid Transit na região. Este, no entanto, foi se esvaindo na medida em que as perspectivas de financiamento e de apoio federal se dissolveram com o Golpe de Estado de 2016 e com a subida ao poder de um governo cujo mote central na área econômica é o corte de “gastos desnecessários”. Assim, objetivos formulados entre os anos de 2014 e 2015 foram revistos visando à menor necessidade possível de recursos.

 

Dentro dessa reprogramação, o atual projeto de integração metropolitana do transporte público da RMF visa manter as zonas tarifárias do antigo sistema intermunicipal, na área continental, bem como não interferir no sistema licitado em 2014, em Florianópolis, ao qual se integrará apenas fisicamente. Ressalta-se que há receios entre as operadoras de transporte público de Florianópolis com relação a uma eventual opção por uma tarifa única metropolitana, pois os custos das linhas de baixo IPK e baixo IR da área continental – na medida em que já não se fala em uma política de subsídios –, deverão ser arcadas por todo o sistema.

 

Vale ressaltar que no atual projeto não se considera a implantação de corredores exclusivos, jogando por terra a concepção do BRT, formulada anteriormente. Assim, se objetiva a construção de dois terminais na parte continental da RMF – embora se cogite efetuar essa integração sem nenhum novo terminal –, para os quais convergiriam linhas alimentadoras dos municípios continentais da região. Um dos terminais se localizaria na divisa de Biguaçu e São José e outro na divisa de Palhoça com São José, em função dos custos dos terrenos nas áreas mais centrais desses municípios. Como se pode observar, a questão do financiamento e das decisões em termos de investimento são essenciais, mas esta, por seu turno, passa por tomadas de decisão que são essencialmente políticas. Diversos exemplos nos mostram que, para os capitais catarinenses de conjunto – os quais modulam a tomada de decisão política –, a mobilidade urbana na Região Metropolitana de Florianópolis não se conforma enquanto uma pauta prioritária de financiamento e investimento, ao contrário do que se aparenta.

 

Um desses exemplos remete à operação de crédito solicitada ao BNDES em 2017 (PL 148/2017), na qual o governo do estado negociou R$ 1 bilhão e 500 milhões para infraestruturas no estado. O projeto de lei foi enviado para apreciação da ALESC, sugerindo a divisão dos recursos para: 1) Investimentos de R$ 700 milhões em rodovias, com o objetivo de finalizar as obras do Pacto por Santa Catarina, constituídas de rodovias e trechos rodoviários dispersas por todo o estado; 2) Viabilizar o FUNDAM 2 (Fundo Estadual de Apoio aos Municípios), fundo que repassa recursos do estado para os municípios e; 3) R$ 300 milhões para o Plano de Mobilidade Urbana Sustentável na RMF e para a Ponte Hercílio Luz. A falta de prioridade se nota na recomendação da casa, de diluir os recursos que seriam direcionados à mobilidade urbana regional, no FUNDAM e nas rodovias.

 

Esses e outros exemplos demonstram que o interesse no planejamento da mobilidade urbana e em sua institucionalidade só ocorrem de modo mais contundente se a qualidade da força de trabalho, de fato, é um processo essencial para a reprodução do capital de uma determinada sociedade. A questão da mobilidade urbana, bem como outros aspectos ligados à reprodução social, como educação, saúde, lazer, acesso a equipamentos culturais e de desporto, entre outras, são uma variável dos próprios padrões de desenvolvimento de uma determinada sociedade.

 

BIBLIOGRAFIA

 

JARAMILLO, Samuel. Crisis de los medios de consumo colectivo y capitalismo periférico. Desarrollo y Sociedad. 1981, p.127-145.

MACKINNON, Danny; SHAW, Jon. Devolution as process: institutional structures, state personnel and transport policy in the United Kingdom. Space and Polity, 2010, vol.14, no. 3, p. 271-287.

RANGEL, Ignácio. Obras reunidas. Rio de Janeiro: Contraponto, 2005.

VAINER, Carlos B. Planejamento territorial e projeto nacional: os desafios da fragmentação. Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais. 2007, vol.9, no.1, p. 09-23.

 
 
 

Dr. Rodrigo Giraldi Cocco

Pós-Doutorando CNPq, bolsista PDJ.

UFSC.