Publicação de artigo – Circulação, transportes e logística em Santa Catarina

01/11/2023 09:10

Autores: Lucas Azeredo Rodrigues e João Henrique Zoehler Lemos

Revista: Boletim Campineiro de Geografia

Link:  https://doi.org/10.54446/bcg.v13i1.2882

Resumo: O Brasil, por todo seu contexto histórico de ocupação territorial, adotou diferentes formas de circulação. Por sua dimensão quase continental, os modais aéreo e rodoviário de transporte compõem um cenário mesclado de competitividade e complementaridade. Nas particularidades da organização espacial do estado de Santa Catarina, os transportes regulares de passageiros nos modais aéreo e rodoviário contribuem para a constituição de uma propensa rede urbana interligada ao centro dinâmico do país. Neste sentido, este trabalho objetiva discutir a organização e o papel das redes de transporte regular de passageiros, nas dinâmicas do desenvolvimento regional e urbano em Santa Catarina. Com base em dados oficiais, destaca-se as direções, densidades, concentrações e diferenciações produzidas no território a partir das operações de ambos os modais de transporte.

O CASO GALEÃO X SANTOS DUMMONT: O REFLEXO DAS ESTRATÉGIAS LOGÍSTICAS

13/04/2023 16:50
Por: Me. Lucas Azeredo Rodrigues (Doutorando-UFSC)
Publicado em: 13/04/2023

A problemática sobre a ociosidade do Aeroporto Internacional Tom Jobim (Galeão) e a sobrecarga do Aeroporto Santos Dummont é resultante de uma série de combinações. Ela é reflexo da adoção de diferentes estratégias logísticas do Estado e do setor corporativo. Além disso, a estrutura econômica e social do Rio de Janeiro também deve ser levada em consideração.

A movimentação de passageiros na capital fluminense passou por um período crescente, sendo que a partir de 2016, começou a ter uma pequena queda. O Santos Dummont, por ser um aeroporto centralizado na capital, era mais utilizado para voos de ponte aérea, ou mais regionais, de curta duração, pois, devido a sua capacidade de operação, não consegue receber aeronaves maiores. Já o Galeão, foi por muito tempo um importante hub nacional e internacional. No entanto, as empresas aéreas começaram a reduzir os voos e concentrá-los na macrometrópole paulista (Campinas, São Paulo e Guarulhos).

No período antes da Pandemia, em 2019, o Santos Dummont recebeu 8,9 milhões, e em 2022, 9,9 milhões. Já o Galeão, saiu de 13,6 milhões para 5,7 milhões no mesmo período. Isso não significa que os passageiros foram transferidos de um aeroporto para o outro, mas sim, que a capital perdeu quase 7 milhões de passageiros.

A própria estrutura do Galeão, sobretudo após a construção do Píer 3 (embarque internacional) coloca o aeroporto numa situação privilegiada no que diz respeito ao sítio aeroportuário, pois, além de seus três terminais, também possui duas pistas que podem ser operadas praticamente de forma simultânea. Ao contrário, o Santos Dummont apresenta diversas limitações, sejam elas de espaço, aeronave crítica ou até mesmo horário de funcionamento.

A capacidade do Galeão é de 37 milhões de passageiros por ano, e do Santos Dummont é de 15,3 milhões. Sobrecarregar os aeroportos reflete, sobretudo na falta de comodidade para o usuário e até mesmo em atrasos. Dados do Flightradar24 apontam que entre 12/04 e 19/04, o Santos Dummont tem previstas 1.179 decolagens para 18 aeroportos, e o Galeão, 386 para 15. De um lado, um aeroporto com 20 posições para estacionamento de aeronaves comerciais, e de outro, 149.

Ora, se tem estrutura, quais questões causariam a queda do Galeão?

A questão da acessibilidade é um ponto. O aeroporto internacional fica localizado na Ilha do Governador, numa região mais afastada do centro. Para chegar no Galeão, tem a opção de Táxi, Aplicativo, Veículo próprio e Ônibus. Este último apresenta algumas variações: o BRT, que liga até o Terminal Alvorada na Barra da Tijuca e passa pelo subúrbio do Rio de Janeiro (é válido destacar o sucateamento desse serviço, que está sendo revitalizado pela prefeitura); executivo, que liga também à Barra, Zona Sul e Rodoviária; o Rodoviário liga às principais cidades da Região dos Lagos; e o coletivo Normal, limitado a alguns bairros adjacentes.

Já o Santos Dummont, além de estar no centro da capital, o que facilita o acesso e barateia a utilização de táxis e aplicativos, conta com a atuação do VLT (Veículo Leve sobre Trilhos). É importante mencioná-lo, pois, além de passar pelo “Coração do Rio de Janeiro”, ele faz integração com todos os modais de transporte da capital, desde as barcas, trens, metrôs, aos terminais de ônibus urbanos, como a Central, ou dos executivos, como o Menezes Cortes.

Entrelinhas, para os usuários do transporte público, chegar no Santos Dummont é mais fácil. Ademais, o Galeão ainda está próximo das principais cidades da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, o que inclusive, configura como um elemento instigador de demanda, no entanto, acessá-lo por transporte coletivo é extremamente complexo, a não ser que seja por veículo particular.

Uma outra questão que afasta pessoas do Rio de Janeiro, é a insegurança.  Os  dados do Instituto de Segurança Pública (ISP) apontam que  Região Integrada de Segurança Pública onde estão inseridos os dois aeroportos: é a área que mais tem roubo de rua no estado, com 21,7 mil casos em 2022 (aumento de 11,8% comparado a 2021); Roubo de veículos, aumentou 36,1%, contabilizando 6 mil casos em 2022.

A questão das concessões dos aeroportos também é um ponto. Recentemente, veio à tona a possibilidade da administradora do Galeão, a Changi, de Singapura, em desistir da concessão. É válido destacar que a brasileira Odebrecht também possuía uma fatia de porcentagem. Juntas, somavam 51% do controle do aeroporto, e os outros 49% da INFRAERO. Com a deflagração da Lava-jato, a Odebrecht renunciou à participação. Recentemente, no Governo Bolsonaro, havia a possibilidade de também conceder o Santos Dummont à iniciativa privada, em conjunto com o Aeroporto de São Paulo (Congonhas), no entanto, a ação foi postergada, cogitando a possibilidade de conceder os dois aeroportos da capital, o que facilitaria atuações conjuntas. A questão tarifária também não é um problema. As taxas do Galeão são menores, exceto a de conexão, que é R$ 0,53 mais cara.

As estratégias logísticas pelas companhias aéreas também é um diferencial. O Galeão por muito tempo, foi um hub internacional, o que ampliava a demanda de conexões com voos domésticos e vice-versa. Aos poucos, as empresas centralizaram suas operações em Guarulhos e por outros hubs mais regionalizados, como Salvador, Recife, Brasília e Belo Horizonte. Utilizar um aeroporto como hub envolve muitos fatores, desde a questão de infraestrutura até a acessibilidade. Geralmente, esses aeroportos centro de operações estão localizados em pontos estratégicos ou até mesmo onde há redução de impostos, como o caso de Campinas e Confins. A redução de um grande volume de custo impõe uma maior competitividade, haja vista que reduz o preço da tarifa. Isto é, a carga tributária do Rio de Janeiro, tanto do município, quanto unidade federativa, é um fator que também afasta as empresas.

Em 2008 a Azul cogitou de fazer o Rio de Janeiro em um hub, no entanto, seria o Santos Dummont. No entanto, isso foi recusado pelo Estado, exatamente por “retirar” passageiros do Galeão. Inclusive, isso foi alvo de ações judiciais. De um lado, a Azul alegava que operar no Galeão era inviável, já que as outras companhias atuavam fortemente lá, e de outro, o Estado a favor de seus interesses, pois, o Galeão estava entrando em processo de concessão, e isso diminuiria o valor do leilão. Nesse cenário, o Santos Dummont estava limitado a aeronaves de 50 passageiros e voos da ponte aérea, o que não era plano, até então, da Azul. O resultado foi: a Azul adotou o aeroporto de Campinas. Apenas em fevereiro de 2023, a Azul teve quase 9 mil pousos e decolagens em Viracopos, distribuídos entre um pouco mais de 60 destinos. A maioria desses voos poderiam ser operados no Galeão, sob sistema de hub.

Ou seja, o próprio Estado inibiu a criação de novas interações. É importante citar que não se trata apenas de um voo. Existe toda uma cadeia produtiva por trás das operações aéreas, das quais constituem uma parcela significativa das hinterlândias aeroportuárias. Desde as locadoras, hotéis, até as tripulações e equipes de solo. É um efeito multiplicador gigantesco, além de incentivar o turismo e outras atividades econômicas.

Neste cenário de desequilíbrio, quais são as alternativas?

O primeiro passo é o diálogo entre a logística de Estado (considerando as três esferas) e a logística corporativa (empresas e companhias aéreas). Diversos impasses podem ser resolvidos ou amenizados.

A limitação operacional do Santos Dummont aparece como uma alternativa imediata, mas não definitiva. Uma situação é operar nesse aeroporto como destino, outra é fazê-lo de hub. Um exemplo, em 2007 a ANAC limitou as operações no Aeroporto da Pampulha (voos mais regionais e com aeronaves de até 50 passageiros), forçando a mudança dos voos para Confins. O problema daquela época para hoje se manteve: poucas empresas aéreas tinham uma frota que pudesse operar dentro das restrições, e aos poucos, o aeroporto foi se tornando subutilizado para aviação comercial.

Não é o caso de se fazer com o Santos Dummont, pois, pode ser utilizado efetivamente como ponto de embarque e desembarque, e o Galeão, como um ponto de conexão. Para isso, as rotas a partir do Santos Dummont seriam basicamente a ponte aérea (RJ-SP) e voos diretos para os principais destinos do país que possuem forte ligações com o Rio de Janeiro, como Salvador, Porto Alegre e Brasília.

No entanto, para que o Galeão possa ser um hub novamente, o número de voos precisa ser ampliado. Mas como?

A utilização de subsídios ficais, como a redução de impostos, seja zerar, ou colocar de forma escalonada, é uma situação que pode atrair novos voos. A primeiro momento, pode se ter a impressão de que o Estado teria prejuízo, no entanto, a partir das atividades desencadeadas a partir das operações aéreas, compensam, ou até aumentam, a arrecadação (vide o exemplo do efeito multiplicador), haja vista que teria um aumento da geração de renda e emprego pela região.

O Rio de Janeiro é a cidade turística do Brasil mais conhecida pelo exterior. Logo, a atratividade por novas atividades relacionadas a lazer pode novamente atrair mais voos internacionais de forma direta, sem precisar de conexão. Fatores que favorecem a economia regional.

Melhorar a acessibilidade ao aeroporto também é uma situação importante. Ter opções de linhas que saem de outros municípios da baixada fluminense (e aqui, podemos incluir a criação de um pequeno terminal rodoviário no aeroporto) também é um ponto interessante. Ficar refém de poucas opções de transporte é algo que inibe o passageiro.

E o Santos Dummont? A limitação de operação de aeronaves de maior porte, e o horário, o torna especial, assim como Congonhas em São Paulo. Estabelecer um teto de voos por companhia aérea, somada à uma política de constituição de um hub no Galeão, é fundamental. A oferta de destinos também é algo que deve ser considerado, haja vista que altera as estratégias logísticas das empresas aéreas. Se for o caso, até mesmo um transfer entre os dois aeroportos poderia também atuar de forma complementar.

Alternativas não faltam. O grande ponto é destrinchar e alinhar os interesses estatais e corporativos por trás das operações entre o Galeão e o Santos Dummont. Quem ganha com isso é o usuário, sobretudo, a população carioca e fluminense.

Autor:

Lucas Azeredo Rodrigues
Mestre e Doutorando em Geografia pela Universidade Federal de Santa Catarina (PPGG/UFSC)
Laboratório de Estudos sobre Circulação, Transporte e Logística (LabCit-UFSC)
Grupo de Estudos em Desenvolvimento Regional  e Infraestrutura (GEDRI-CNPq)
Núcleo de Estudos Sobre Transporte (NETRANS-UNILA)
Grupo de Estudos sobre Transportes Urbano-Regional (GETUR)

A modernização do transporte ferroviário de Cuba

31/12/2021 13:00

Por: Profº Dr. Nelson Fernandes Felipe Jr (UNILA)

 

Em 1837, Cuba foi o sétimo país do mundo e o primeiro da América Latina e Caribe a possuir o transporte ferroviário. Todavia, nos últimos trinta anos, houve uma precarização do serviço, principalmente porque desde a década de 1970 Cuba não recebia mais trens e locomotivas para operarem no sistema. A União Soviética enviou, nos anos de 1960 e 1970, algumas composições novas e, sobretudo, trens usados para serem utilizados no país caribenho. As ferrovias cubanas, desde os anos de 1990, são prejudicadas pela falta de manutenção e escassez de equipamentos modernos, como resultado da dissolução da União Soviética, da dificuldade de estabelecimento de novas parcerias tecnológicas e do embargo econômico/comercial dos Estados Unidos (SPUTNIK; vermelho, 2019).

Para mudar esse cenário, o governo cubano criou o Programa de Recuperação e Desenvolvimento do Meio de Transporte Ferroviário, que se estenderá até 2028. Como consequência desse projeto, a Russian Railways – empresa que controla as estradas de ferro na Rússia – firmou um contrato de US$ 1,98 bilhão com a União de Ferrovias de Cuba. A estatal russa será responsável por promover a ampliação e modernização da infraestrutura ferroviária no território cubano, com o objetivo de incrementar a circulação de passageiros e produtos e fomentar o desenvolvimento econômico. O projeto e o contrato firmado entre os países estabelecem que pouco mais de mil quilômetros de ferrovias serão modernizadas, além da criação de um centro de controle para gerenciar o tráfego ferroviário (SPUTNIK; vermelho, 2019).

Essas melhorias permitirão aumentar a segurança no transporte, elevar a velocidade, ampliar a abrangência espacial da rede ferroviária e otimizar o funcionamento do sistema (fluxos, horários, identificação e redução de erros de operação etc.). Outrossim, em 2019 e 2020, Cuba recebeu 160 novos vagões fabricados na China que estão em circulação para atender a demanda por transporte no país, especialmente na capital Havana, e essa frota será ampliada nos próximos anos (ALEKSÁNDROVA, 2019, 2020).

A aquisição dos novos vagões e locomotivas foi/é resultado de uma parceria com a China, assim, esse acordo prevê que o país asiático deverá produzi-los e também fornecer empréstimos para Cuba poder compra-los. A modernização e a operação das novas composições ferroviárias permitem aumentar a velocidade e diminuir o tempo das viagens. Cada trem possui capacidade para transportar 766 passageiros e existem diversas linhas que interligam cidades importantes, como Havana, Matanzas, Santiago de Cuba, Holguín e outras (SPUTNIK; vermelho, 2019).

Em 2018, o sistema ferroviário de Cuba transportou 6,1 milhões de passageiros e, a partir desse projeto, das parcerias com a Rússia e a China e os investimentos que serão realizados nos próximos anos, o governo cubano prevê que todas as obras estejam finalizadas até 2030. Além disso, há possibilidade de construção de uma linha ferroviária para circulação de trens de alta velocidade, conectando Havana ao balneário de Varadero (ALEKSÁNDROVA, 2019).

Os países da América Latina e Caribe apresentam pontos de estrangulamento nas infraestruturas e precisam avançar no processo de integração territorial, diante disso, é importante fomentar especialmente o modal ferroviário e a multimodalidade/intermodalidade. Em relação aos grandes projetos de infraestruturas na atualidade, destaca-se a Iniciativa Cinturão e Rota (também denominada de Nova Rota da Seda), em que o governo da China pretende investir mais de US$ 1 trilhão em infraestruturas na Ásia, Europa, Oriente Médio e África. O plano chinês iniciou-se em 2013 visando criar novas oportunidades de investimentos, impulsionar o comércio e o crescimento econômico, aumentar a fluidez e as redes intermodais, entre outros.

A China se destaca na expansão dos fixos no seu território e também em outros países. O desenvolvimento econômico chinês é resultado de vários fatores, como o planejamento estatal, os vultosos investimentos em infraestruturas econômicas e sociais (grandes projetos e obras, notadamente a expansão/modernização dos equipamentos e serviços de utilidade pública), o fomento da indústria, a agregação de valor e tecnologia na produção, a valorização da C&T, as empresas estatais estratégicas, os financiamentos e subsídios, entre outros.

A intensificação da inserção chinesa no comércio, nas parcerias e nos investimentos internacionais, bem como as mudanças na lógica produtiva e exportadora, são relevantes para compreender o dinamismo do país asiático. Ademais, a China vem ampliando as inversões e os acordos comerciais com os países periféricos, principalmente com nações da África e da América Latina e Caribe (caso da modernização do sistema ferroviário de Cuba). Assim, a China assegura o acesso às matérias-primas (importantes para a produção industrial), aumenta as possibilidades de investimentos das empresas estatais e privadas chinesas (energia, construção civil pesada, indústrias de média e alta tecnologia, mercado de ações etc.) e garante mercados consumidores para suas mercadorias, sobretudo manufaturas, têxteis, eletroeletrônicos, informática e bens de capital (JABBOUR, 2010).

Considerando o ambiente internacional de exacerbada competição, cujos efeitos se desdobram rapidamente na América Latina e Caribe, é necessário os países avançarem na integração territorial e nas parcerias estratégicas, valorizando a expansão das infraestruturas, a cooperação política, econômica, financeira e tecnológica, o incremento do comércio, a defesa dos interesses comuns das nações, entre outros. Entretanto, isso somente é possível com a existência de condições políticas favoráveis (o que não existe no Brasil desde 2016) e com o estabelecimento de uma política macroeconômica desenvolvimentista, com destaque à expansão/modernização dos equipamentos e serviços de utilidade pública (transportes, energia, telecomunicações, saúde, educação, saneamento básico, internet etc.). Exemplos nesse sentido são verificados atualmente na África (Etiópia), na América Latina e Caribe (Cuba) e na Ásia (Vietnã, China, Coreia do Sul, Cingapura etc.). Ao mesmo tempo que alguns países estabelecem projetos e programas de desenvolvimento, o Brasil afunda na crise política, econômica e social. Esperamos um futuro melhor!

Referências

ALEKSÁNDROVA, M. Cuba receberá US$ 2 bilhões da Rússia para suas redes ferroviárias. 2019. Disponível em: https://br.rbth.com/economia/82937-russia-dara-2-bilhoes-ferrovias-cuba. Acesso em: 17/08/2021.

JABBOUR, E. Projeto nacional, desenvolvimento e socialismo de mercado na China de hoje. Tese de Doutorado em Geografia. Universidade de São Paulo (USP). São Paulo, 2010.

SPUTNIK. Cuba inaugura novo sistema ferroviário em parceria com Rússia e China. 2019. Disponível em: https://operamundi.uol.com.br/sociedade/59478/cuba-inaugura-novo-sistema-ferroviario-em-parceria-com-russia-e-china. Acesso em: 16/08/2021.

VERMELHO. Com a ajuda de China e Rússia, Cuba inaugura sistema ferroviário. 2019. Disponível em: https://vermelho.org.br/2019/07/14/com-a-ajuda-de-china-e-russia-cuba-inaugura-sistema-ferroviario/. Acesso em: 18/08/2021.

Autor

Prof. Dr. Nelson Fernandes Felipe Junior

Docente do curso de Geografia

UNILA/PPGICAL

Tags: CubaDesenvolvimento econômicoInfraestruturasTransporte ferroviário

Transporte aéreo no Brasil em tempos de Covid-19: possibilidade de um novo mercado?

28/03/2020 13:00

De acordo com a Associação Internacional de Transporte Aéreo (IATA), 2019 foi o primeiro ano após 2009 que a aviação obteve um crescimento anual inferior a 5%. Entretanto, outras variáveis se destacaram, como a pontualidade, taxa de ocupação e oferta de assentos, resultado dos aperfeiçoamentos logísticos que as companhias aéreas vêm adotando nos últimos anos por intermédio da indústria da aeronáutica. Contudo, do ano de 2019 para 2020, a imagem de aviões paralisados em aeroportos por todo o mundo vem tomando proporção conforme o avanço da COVID-19 (coronavírus). A pandemia que assola o planeta vem obrigando as companhias aéreas a adotarem medidas severas de contingenciamento de gastos. Dentre essas ações podemos destacar a paralização de voos internacionais e intercontinentais, além da alteração drástica da malha aérea e redução dos postos de emprego.

Figura 1: Aeroporto Logístico do Sul da Califórnia em Victorville, Califórnia.

Foto: Mark Ralston AFP/Getty Image.

Disponível em: Los Angeles Times, 2020

Embora a imagem acima seja condizente com o maior tráfego aéreo do mundo (E.U.A), no Brasil há de se tornar também realidade, sobretudo, após a publicação da ANAC no dia 27/03/2020, noticiando uma redução de 91% da malha aérea prevista pelas companhias aéreas brasileiras para o mesmo período sem anormalidades. A curva de casos do COVID-19 no Brasil inicia a escala para o momento de ápice, e um dos elementos fundamentais para diminuir o pico é a redução da circulação no país.

 

Ao observar como o vírus se instalou nos diferentes países do mundo, fica evidente que as menores ocorrências se deram justamente nos países que restringiram severamente a circulação de pessoas e mercadorias. Isto é, referem-se à diminuição quase que total dos meios de transporte em massa, dentre eles o transporte aéreo. Entretanto, a grande incógnita levantada pelas companhias, diante da paralisação das atividades, diz respeito aos custos operacionais obrigatórios com manutenção e pessoal.

 

Os mesmos agentes que buscam aplicar o modelo de livre mercado e intervenção mínima do Estado vão aos seus respectivos Governos solicitarem ajuda e resgate para o período de crise. Trata-se da maior crise que o setor teve desde seu início no primeiro quarto do século XX (do ponto de vista global). Por mais que seja contraditória pregar a menor atuação do Estado, mas ao mesmo tempo depender dele para se manter positiva, devemos ressaltar que as operações aéreas exigem cada vez mais da relação/interação a logística de Estado e a logística corporativa, atuando de forma combinada em prol de um maior bem-estar social, isto é, o Estado agir como órgão mais atuante a favor da população, e não apenas para as grandes corporações.

 

No Brasil, podemos destacar a atuação da Agência Nacional da Aviação Civil (ANAC) e da Secretaria da Aviação Civil (SAC), como os principais agentes normativos do setor, e também de órgãos representantes do meio corporativo como a Associação Brasileira da Aviação Civil (ABEAR). A aviação comercial brasileira sempre apresentou picos de movimentação desde o início das suas operações regulares na década de 1920 até o período recente, o qual se configura como período de transição de um segundo oligopólio (Gol, Latam e Azul) para a internacionalização do setor.

 

Entretanto, as respostas das companhias aéreas “brasileiras” têm sido semelhantes, como a redução de frota ativa (operando apenas as que possuem melhor custo-benefício), antecipação de férias, fechamento de bases (principalmente as regionais), licenciamento não-remunerada de trabalhadores, suspensão de voos internacionais, diminuição e corte de serviços de bordo, dentre outras ações (quem se beneficiou com isso foi o mercado financeiro, que assistiu a uma drástica desvalorização e recentemente uma nova valorização das ações das companhias). Por outro lado, o receio de viajar fez com que muitas viagens fossem canceladas ou adiadas, porém sem custos adicionais para o usuário.

 

O principal ponto de reflexão neste momento delicado de avanço do COVID-19 é exatamente a circulação que envolve o transporte aéreo. Isto é, as interações espaciais proporcionadas pela aviação numa escala local-global e vice-versa. Ora, numa operação aeroportuária envolvem-se agentes que circulam em diversos espaços, desde a tripulação a equipes de solo, manutenção, limpeza, catering, agentes aeroportuários, lanchonetes e restaurantes, transporte coletivo ou por aplicativo, dentre outros.

 

Isto significa que é incalculável a quantidade de pessoas e cargas que colaboram para a circulação dos fluxos aéreos. A estratégia de enxugamento das companhias brasileiras visou à concentração de voos nos seus hubs, isto é, nos principais aeroportos do estado paulista, exatamente no epicentro da pandemia no país. Se, por um lado, já foi comprovado que o COVID-19 chegou ao país por voos internacionais, por outro não se sabe quantas pessoas poderiam ter sido contaminadas. Diante do tempo de 3 a 5 dias para que o vírus se manifeste no corpo humano, muitas pessoas podem ter viajado sem ao menos saber que estavam contaminadas.

 

Isso serve de alerta. No que diz respeito à política de centralização das operações adotada pelas companhias aéreas brasileiras, trata-se de postura absolutamente equivocada, que tende a causar impactos negativos. Propor a ideia de conexão de voos exatamente onde há mais casos, só favorece uma maior circulação de pessoas (mesmo que a aviação esteja em números reduzidos). Veja-se, ainda, que as pessoas que trabalham nesses locais ficam mais vulneráveis ao vírus, e a chance de propagação é maior, principalmente devido ao contingente populacional da região.

 

Se observamos a quantidade de municípios com casos confirmados até o momento e a quantidade de voos que ocorreram no mês anterior, veremos que na sua maioria há um grande contingente populacional e circulação de pessoas, além da presença de aeroportos, basta vermos a figura abaixo. E em paralelo, temos a redução de 90% da malha área, concentrando voos exatamente em locais com grandes números de casos.

 

Figura 2. Mapa dos fluxos aéreos e do COVID-1

Embora seja recomendada a suspensão total da circulação como um todo, é necessário lembrar dos deslocamentos que precisam ser realizados de forma urgente, e que nessa relação espaço-tempo a aviação se destaca. Por isso, não é recomendável a suspensão completa, mas que seja ofertada uma demanda que seja apenas essencial. Contudo, o ato de concentrar voos em uma localidade, como estado de São Paulo, facilita a propagação do vírus. Uma boa estratégia seria a utilização de aeroportos mais isolados, com um menor número de pessoas circulando. O que estamos afirmando aqui é que o transporte aéreo (assim como outros meios de locomoção em massa) é um dos agentes responsáveis pela propagação do vírus, e o mesmo deve ser utilizado com o máximo de cautela e planejamento.

 

De antemão, o Covid-19 já deixou evidente alguns pontos que precisam ser revisados no que diz respeito à aviação comercial:

  • O Estado precisa intervir de forma mais consistente no setor aéreo, isto é, ser um agente mais ativo na aviação, buscando uma harmonia entre o meio corporativo e o usuário, diminuindo o domínio completo do mercado e estabelecendo mais regulação.

  • Revisão urgente dos algoritmos geradores das tarifas aéreas, pois nesse cenário houve uma queda considerável do preço das passagens, o que nos mostra que é possível uma redução do valor da passagem.

  • O Estado deve revisar o sistema de tributação sobre os serviços aeroportuários.

  • Num cenário de redução de custos, as fusões, associações, falências e aquisições serão cada vez mais visíveis, cabendo aos organismos de regulação a adoção de medidas que levem em conta os diferentes cenários, pois isso acarretará na concentração de capital, ao mesmo tempo em que postos de trabalho poderão ser extintos como forma de enxugamento da folha salarial.

  • Proteção aos trabalhadores do setor aéreo, tendo em vista a dinamicidade do setor diante das realidades socioeconômicas.

  • No caso brasileiro, por ter a flexibilidade 100% de capital estrangeiro nas empresas aéreas, assistiremos a fuga de capital para o meio corporativo (embora as companhias estejam na bolsa de valores).

  • Necessidade de revisar o sistema de hub e o fortalecimento (ou renascimento) da aviação regional quando houver a normalização da economia.

  • Revisar as políticas sanitaristas visando novas formas de conter possíveis pandemias futuras. Isto é, no âmbito nacional, por intermédio da Agência Brasileira de Vigilância Sanitária (ANVISA), criar um sistema que sirva de barreira para chegada de estrangeiros no país, tendo em vista que a maior parte dos contaminados do COVID-19 desembarcaram no Brasil em voos oriundos da Europa ou em navios de cruzeiro. Não se trata de proibir, mas de usar novas formas de precaução, como quarentena obrigatória em determinados casos, exames médicos rápidos, exigência de vacinas, dentre outros.

  • A retomada de crescimento econômico na escala nacional deveria se dar por intermédio do Estado. Entretanto, observando as formas debilitadas de atuação do Governo Federal, será algo que levará um bom tempo para a retomada de crescimento, principalmente diante da ausência de políticas desse tipo, como foi o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e o Plano de Integração Logística (PIL), que mostraram a capacidade de crescimento do PIB brasileiro entre 2003 e 2012. Logo, acredita-se que na aviação o ritmo também se dará de forma devagar e anêmica, tendo em vista os serviços que necessitam do deslocamento via modal aéreo, como o turismo, responsável por uma parcela considerável do PIB nacional.

  • A necessidade de isolamento demonstrou no setor que há a possibilidade de enxugamento de diversos postos de trabalho, principalmente aqueles que exigem o quantitativo humano. Parte deles são feitos à distância. Entretanto, no setor aéreo algumas dessas mudanças já eram visíveis, como despacho automático, check-in online, embarque por código, ações pelo celular, dentre outras ações que há menos de 10 anos eram realizadas por trabalhadores.

Há a necessidade do Estado Nacional atuar em conjunto com os Governos Estaduais no combate ao COVID-19 (o que não vem acontecendo no Brasil). A limitação da circulação de pessoas (a qual inclui o transporte aéreo) em alguns estados foi medida implementada drasticamente, justamente por se considerar que é a principal forma de propagação do vírus, e o transporte aéreo assume esse papel de transmissor (mesmo que indiretamente). Portanto, quanto mais cedo a população se precaver, mais cedo a economia voltará a funcionar normalmente, embora se saiba que a recuperação não se dará em questão de dias. Mas, para isso, o Estado (principalmente federal) deve tomar medidas para que a população mais carente tenha acesso a fontes de renda, deixando apenas a operacionalidade de serviços essenciais.

 

As sequelas que o covid-19 deixará para o setor aéreo ainda são incalculáveis. No entanto, a necessidade de rever a forma de atuação do setor aéreo também é urgente. Os grandes capitais sempre agem em prol da lucratividade. O Estado (via neoliberalismo) flexibiliza ao máximo as regras do setor de forma predatória em prol do livre comércio, mas pouco pensa no bem-estar social, mas, sim, em atender aos interesses das grandes corporações. Talvez esse seja o momento para repensarmos no tipo de aviação que queremos. O alarmismo que o setor vem tonalizando no último mês é reflexo de que as ações da logística de Estado e corporativa devem agir de forma combinada em prol da população, pois sem passageiros não há fluxo. E diante desse contexto convém resgatar o pensamento de Milton Santos: de que o espaço é formado por um conjunto indissociável de sistemas e objetos em interação.

 

A concentração de voos (sistema de hub-and-spoke) precisa ser revista para evitar possíveis aglomerações em áreas com alto índice de casos. No entanto, para o capital corporativo, quanto menor o custo, maior o lucro (mesmo em períodos de crise), objetivando uma maior centralização do capital. Longe, é claro, da preocupação com o bem-estar social das pessoas envolvidas nessas interações espaciais que são propagadas por intermédio do transporte aéreo.

 

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Me. Lucas Azeredo Rodrigues

Graduado em Geografia (UFFS)

Doutorando em Geografia (PPGG-UFSC)

Laboratório de Estudos sobre Circulação, Transporte e Logística – LABCIT (UFSC)

Grupo de Estudos sobre Dinâmicas Regionais e Infraestrutura – GEDRI (CNPq)

Núcleo de Estudos sobre Transportes – NETRANS (UNILA)

ANEXOS

Tags: COVID-19EconomiaGeografia dos TransportesLogísticaTransporte aéreoTransporte aéreo comercial

O patrimônio cultural ferroviário no Ramal São Francisco: da formação das cidades até as recentes reestruturações

10/11/2019 13:00

O início da exploração da malha ferroviária no Brasil data-se do ano de 1852, ainda no período imperial, conforme dados do Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes (DNIT, 2018), onde cita o Decreto n.º 641 de 26 de junho de 1852, que propunha vantagens, isenções e garantias aos investidores nacionais e estrangeiros. Este movimento teve como início a necessidade de escoar com maior facilidade a produção agrícola dos Estados para as regiões portuárias. Conforme Carrion (2015), a partir da instalação das primeiras ferrovias no país, a expansão ferroviária deu-se de forma rápida. Ainda, segundo o autor, estima-se que em 1907 a malha ferroviária atingia 17.280 quilômetros, transportava 35 milhões de passageiros e 7,5 milhões de toneladas de carga. Estes números demonstram o grande potencial econômico do meio de transporte, devido a sua utilização para o transporte de pessoas e escoamento da produção agrícola e extrativista. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 1957), o sistema ferroviário no Brasil chegou a aproximadamente 38 mil quilômetros de extensão, sendo considerada a 8ª maior ferrovia do mundo.

 

A ferrovia é concluída na região nordeste do estado de Santa Catarina no ano de 1910, com ramal que fazia parte da Estrada de Ferro São Paulo Rio Grande (EFSPRG) conforme retratado por Henkels (2005) “[...] na concessão original (da EFSPRG) se previam dois ramais laterais, um para Guarapuava PR e outro que buscasse algum porto no estado de Santa Catarina a ser definido”. O porto escolhido foi o de São Francisco do Sul, então em 1903 começam os estudos para construção do Ramal São Francisco, que partiria “[...] de Rio Negro, no Estado do Paraná, atravessaria a Serra Geral (atual Serra do Mar), passando por Joinville, em busca de um porto na baía de São Francisco.” (HENKELS, 2005). A obra era vista com bons olhos pela população, que a compreendia como um instrumento de desenvolvimento, sendo que a estrada de ferro mudou as características sócio-econômicas da região levando, inclusive, a criação de municípios como Jaraguá do Sul, que antes era distrito de Joinville.

 

Figura 1: Estação Ferroviária de Jaraguá do Sul, Terminal de Passageiros em 1962.

Fonte: Acervo de Ergon Arno Krepsky

A RFFSA foi criada em 1957, através da Lei nº 3.115, de 16 de março de 1957, com o objetivo principal de promover e gerir os interesses da União no setor de transportes ferroviários. Além disso, a empresa seria responsável por resolver conflitos referentes à falta de integração das malhas ferroviárias brasileiras, que:

 

Estavam voltadas à exportação de produtos primários, eram desarticuladas entre si, atendiam a interesse privados localizados, não seguiam parâmetros técnicos comuns (do que a diferença de bitolas é a expressão mais óbvia) o que dificultava a integração física entre as diferentes malhas e aumentava os custos de operação, devido à necessidade de sucessivos transbordos de cargas (CARRION, 2015).

 

Com isso, a partir da década de 1960, o transporte ferroviário começa a sofrer um declínio em todo o país, Santos e Silva (2015) afirmam que isso deu-se devido a substituição dos investimentos na área pelo investimento no transporte rodoviário, que apesar de mais custoso a longo prazo, exige menos investimentos para sua aplicação. Telles (2011) declara que esta mudança ocorre principalmente após a instalação da primeira indústria automobilística no país. Com a popularização do transporte rodoviário e o investimento feito na construção de estradas (como a BR-101 e BR-280) o transporte de passageiros por ferrovias começa a sofrer um processo gradativo de abandono “[...] com a diminuição dos passageiros e cargas, com a competitividade do transporte rodoviário e com a diminuição dos investimentos do Governo Federal” (JULIO e SILVEIRA, 2016).

 

Entre os anos de 1996 e 1998, o modelo ferroviário brasileiro foi segmentado em seis malhas regionais, concedendo a empresas privadas o direito de exploração das malhas pelo período de 30 anos. Com isso, a RFFSA foi dissolvida através do Decreto nº 3.277, de 7 de dezembro de 1999.

 

Com a extinção da RFFSA, a maioria das estações foram fechadas por falta de utilidade na operação para o transporte de cargas, processo que levou à deterioração gradativa dos prédios, devido ao esquecimento e invasões recorrentes, representando uma ameaça iminente ao desaparecimento de importantes exemplares do Patrimônio Cultural Ferroviário.

 

Figura 2: Estação Rio Vermelho em São Bento do Sul em 2018

Fonte: Acervo de Anthar C. Hartmann

O Conceito de Patrimônio Cultural surge em 1988 na Constituição Federal, em seu Artigo 2016 que ampliou o conceito de patrimônio estabelecido pelo Decreto-lei nº25, de 30 de novembro de 1937, substituindo a denominação de Patrimônio Histórico e Artístico por Patrimônio Cultural Brasileiro. Essa alteração incorporou o conceito de referência cultural a definição dos bens passíveis de reconhecimento, sobretudo os de caráter imaterial

 

Com a necessidade de nomear-se um órgão para ser o responsável pelo espólio da extinta RFFSA, Prochnow (2014) afirma que a Lei nº 11.483 de 31 de maio de 2007 foi responsável por atribuir ao IPHAN a responsabilidade pela preservação dos cerca de 50 mil bens móveis e imóveis:

 

Art. 9o Caberá ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN receber e administrar os bens móveis e imóveis de valor artístico, histórico e cultural, oriundos da extinta RFFSA, bem como zelar pela sua guarda e manutenção (BRASIL, 2007).

 

Ao fazer uma análise superficial da estrutura das cidades do nordeste de Santa Catarina, já é possível perceber a importância histórica da ferrovia e sua relevância na compreensão da morfologia urbana dos municípios por onde passa. A malha ferroviária é um dos principais estruturadores de formação das cidades. É quase impossível encontrar áreas onde as estações não estejam em regiões urbanas ou de pequenas centralidades, desenvolvidas predominantemente durante o período de utilização das linhas para o transporte de passageiros.

 

Como exemplo claro deste processo, podemos usar o município de Jaraguá do Sul, que teve o início de sua ocupação às margens do rio Itapocu. Com a instalação das estações ferroviárias (uma no atual bairro Centro e outra no atual bairro Nereu Ramos) a ocupação da cidade começa a se desenvolver naquelas regiões, incentivando a formação de centros comerciais e de serviços conforme retratado por Costa (2015) ao afirmar que “[...] a estrutura influenciou a vida social de Jaraguá do Sul. O local também era um ponto de encontro da comunidade”.

 

Sendo assim, deve-se considerar a ferrovia e os bens móveis e imóveis provenientes de sua exploração, principalmente no século passado, parte da dinâmica social de diversas cidades, ao ocupar papel importante na memória de seus habitantes. Porém, ao realizar pesquisas de publicações sobre o assunto, é possível perceber a falta de documentos que comprovem esta relação, o Patrimônio Cultural Ferroviário encontra-se em risco. Atualmente existe dificuldade por parte do IPHAN em gerir e garantir a manutenção dos bens imóveis, sem contar o problema relacionado aos bens móveis que correm grande risco de desaparecer como retratado por Xavier e Constantino (2017, p. 162):

 

Em relação às cidades que possuem esse acervo, sabemos que existe um rico conjunto de edificações ferroviárias que merece atenção e ações efetivas dos órgãos de preservação municipais e estaduais, visto que muitos edifícios ainda estão abandonados, alguns deles na zona rural, sendo necessárias medidas urgentes de restauro e conservação, evitando assim maiores perdas deste patrimônio.

 

Este projeto visa enfatizar a importância da ferrovia como instrumento transformador do espaço. Ao mapear a estrutura urbana no entorno das edificações de patrimônio ferroviário na região nordeste do Estado, será possível esclarecer para as futuras gerações a importância destes no processo de desenvolvimento das cidades. Além disso, ao propor este estudo será possível ter uma visão do patrimônio ferroviário no região de forma menos generalista, garantindo o respeito às suas particularidades sócio-econômicas.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

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_____. Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes. Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes. Ferrovias. Disponível em: <http://www1.dnit.gov.br/ferrovias/historico.asp>. Acesso em: 17 set. 2018.

 

_____. Lei nº 3115, de 16 de março de 1957. Determina a transformação das empresas ferroviárias da União em sociedades por ações, autoriza a constituição da Rede Ferroviária S.A., e outras providências. Brasília, DF,

 

_____. Lei nº 11483, de 31 de maio de 2007. Dispõe sobre a revitalização do setor ferroviário, altera dispositivos da Lei no 10.233, de 5 de junho de 2001, e outras providências. Brasília, DF,

 

_____. Decreto nº 641, de 26 de junho de 1852. Autoriza o Governo para conceder a huma ou mais companhias a construção total ou parcial de um caminho de ferro que, partindo do Municipio da Côrte, terminar nos pontos das Províncias de Minas Geraes e S. Paulo, que mais convenientes forem. Leis do Império do Brasil - 1855. Rio de Janeiro, RJ,

 

CARRION, Raul. As ferrovias como instrumento de desenvolvimento nacional. 2015. Disponível em: <http://www.vermelho.org.br/coluna.php?id_coluna_texto=7225&id_coluna=147>. Acesso em: 05 set. 2018.

 

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HENKELS, Henry. Canal do Linguado. 2005. Disponível em: <https://sites.google.com/site/hhenkels/canal_linguado-1>. Acesso em: 17 set. 2018.

 

IPHAN. Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Portaria nº 407, de 21 de dezembro de 2010. Dispõe sobre o estabelecimento dos parâmetros de valoração e procedimento de inscrição na Lista do Patrimônio Cultural Ferroviário, visando à proteção da memória ferroviária, em conformidade com o art. 9º da Lei n.º 11.483/2007. Brasília, DF,

 

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JULIO, Alessandra dos Santos; SILVEIRA, Márcio Rogério. As estradas de ferro em Santa Catarina: Evolução, projetos e contradições. In: SILVEIRA, Márcio Rogério (Org.). Circulação, transportes e logística: No estado de Santa Catarina. Florianópolis: Insular, 2016. p. 139-174.

 

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